08 de março de 2009
Com salário médio de R$ 4.752,94, professores da rede pública ameaçam
cruzar os braços na quarta se não receberem do gdf aumento de 18,9%, índice
três vezes maior do que a inflação registrada pelo IPCA em 2008, de 5,9%
Fonte: CORREIO
BRAZILIENSE (DF)
Lilian Tahan e Elisa Tecles
Da Equipe do Correio
As palavras passaram a fazer sentido para Ester Nascimento há pouco tempo. Aos
seis anos, ela iniciou em fevereiro a primeira série na Escola Classe da
Estrutural, onde mora com a mãe, e até o final do ano deve ler com desenvoltura
um livrinho de histórias. A alfabetização da pequena estudante, no entanto,
corre o risco de ser adiada. A aluna está entre os 520 mil jovens e crianças
que terão a rotina Escolar interrompida se os professores da rede pública
decidirem cruzar os braços em abril, quando o sindicato da categoria programa
uma assembléia-geral. Na próxima quarta-feira, haverá um ato de protesto com
paralisação. Desde o início do ano, a ameaça de greve voltou a rondar as 620
Escolas do Distrito Federal. Com salário médio de R$ 4.752,94, os docentes
exigem do governo aumento de 18,9%. O percentual é três vezes maior do que a
inflação do ano passado, que fechou em 5,9% segundo o Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA).
O risco de paralisação angustia os pais e desanima os alunos, que se tornam as
principais vítimas da queda-de-braço dos professores por aumento de salários.
"Acho que a alfabetização é uma das partes mais importantes para um aluno.
Não é justo que minha filha seja prejudicada", lamenta a mãe de Ester, Islam
Nascimento, que todas as tardes estimula o desenvolvimento da filha com
exercícios de caligrafia. A preocupação é compartilhada por Michele Marise, mãe
de Bruna, 11 anos, que iniciou a 5ª série este ano. "O tempo afastado gera
sequelas irreparáveis no aprendizado, além de causar transtorno na rotina da
casa, porque a gente que trabalha conta com a Escola como um lugar seguro onde
os nossos filhos são supervisionados, diz Michelle.
O indicativo de greve anunciado pelo sindicato dos professores ocorre dentro de
um contexto de fragilidade financeira do tesouro local, o que provocou um
impasse nas negociações entre sindicato e o governo. A repercussão da crise
econômica que surpreendeu o mundo apresenta agora a fatura à economia do GDF.
Uma das receitas mais importantes para a capital da República, a do chamado
Fundo Constitucional, está vinculada ao desempenho fiscal da União. O repasse
dos recursos garantidos em lei para o pagamento de pessoal na saúde, segurança
e Educação será tanto maior quanto melhor for a arrecadação do governo federal.
As previsões, no entanto, apontam para queda da receita em 2009, o que jogará
para baixo também as transferências previstas para o DF. Com base no desempenho
do governo federal dos últimos sete meses, já se prevê, por exemplo, que o
aporte de verbas federais em 2010 será o menor desde a criação do Fundo
Constitucional, em 2002. É que desde julho do ano passado, a medição de
riquezas da União variou para baixo na maioria dos meses. Só para se ter ideia,
entre novembro e dezembro a Receita Corrente Líquida, que já apresentava queda
de 7%, minguou em 36%.
O impacto desse encolhimento foi projetado até junho do ano que vem, quando
fecha o ano fiscal e, portanto, se tem a base de cálculo para as
transferências. O resultado, na melhor das hipóteses - se os efeitos da crise
se estabilizarem -, é que se terá um índice de crescimento de apenas 3,6%. Esse
percentual é seis vezes mais baixo do que a performance no primeiro semestre de
2008, quando o Fundo Constitucional atingiu a melhor fase, registrando aumento
de quase 19%.
E é justamente sobre esse reajuste recorde que os professores pretendem
emparelhar os salários de 2009 e 2010. A vinculação das remunerações ao Fundo
Constitucional foi prevista no início de 2007, quando ocorreu a aprovação do
plano de cargos e salários. Mas, recentemente, a medida foi condenada pelo
Ministério Público, que apresentou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade
contestando a base de cálculo para corrigir a folha de pessoal da Educação. O
MP sustenta que não se pode atrelar aumento de salário a índices variáveis,
como é o caso dos repasses do fundo, sob risco de provocar um aumento em
cascata.
R$ 32 milhões a menos
A desaprovação do Ministério Público não é o único impedimento do governo para
chegar aos patamares reclamados pelos professores. Além das perspectivas de
repasses menores, o GDF alega que a receita recolhida com impostos e taxas
sofreu em janeiro frustração de, pelo menos, 6,9%. Frustração é um termo usado
quando o governo programa um valor de arrecadação que não se confirma. Em
números absolutos, significa dizer que o tesouro local teve R$ 32 milhões a
menos em apenas um mês.
Em fevereiro, essa diferença entre expectativa e receita real foi ainda maior,
de 12%, ou R$ 72 milhões, dinheiro que daria para construir 36 Escolas públicas
ou até oito postos de saúde. "Vivemos um processo de desaceleração da
economia. A cada mês que passa se arrecada menos, o que ocorre em função da
distorção, provocada pela crise, entre a previsão do que o governo pretendia
arrecadar e o que de fato se confirmou", explica o secretário de
Planejamento, Ricardo Penna.
O impacto de um aumento de salários na proporção reivindicada pelo sindicato
dos professores custaria ao ano R$ 640 milhões. O valor equivale a um terço do custo
de todas as obras de infraestrutura que o governo pretende realizar em 2009, um
impacto com o qual o GDF sustenta não ter a menor condição de se comprometer,
sob o risco de precisar rever ações consideradas como prioridade e programadas
para os próximos meses. Entre elas, estão os investimentos no transporte
público, saúde, segurança, além dos programas de assistência social