06 de junho de 2009
CONSEQUÊNCIA - Sem aulas há mais de um mês, aprovação no vestibular está
comprometida
Fonte: LIBERAL (PA)
A greve dos professores no Pará chega a exatos 32 dias e deixa milhares de
alunos, que dependem da rede pública de ensino, cada vez mais longe do direito
a um curso superior. Desde o início do ano letivo de 2009, muitos estudantes do
Estado só tiveram uma aula de Literatura, duas avaliações de História - que
valeram por quatro - e nenhuma vez sequer assistiram matérias como Matemática e
Redação. Com a proximidade do vestibular aumenta a preocupação desses jovens. E
eles já esperam pelo pior.
A menos de um mês para terminar o semestre, a rede estadual aplicou apenas a
primeira avaliação. Nas Escolas particulares, os estudantes estão aguardando a
revisão que antecede a segunda avaliação semestral, programada para o período
de 22 a 30 deste mês. Muito mais que expor a situação salarial dos professores,
a paralisação - já considerada abusiva - embota os anseios dos alunos.
A manutenção do movimento grevista será avaliada pelos manifestantes em uma
assembleia convocada pelo Sindicato dos Trabalhadores na Educação Pública do
Pará (Sintepp) amanhã de manhã. Até ontem, as Escolas ainda estavam fechadas.
A coordenadora pedagógica de uma Escola particular, Brizeida Suzuki, diz que
alguns professores até já concluíram o conteúdo do primeiro semestre. Ela
acredita que ter um calendário Escolar de cinco meses semestrais é importante e
comprometê-lo é colocar em risco a qualidade do ensino.
O estudante da terceira série do ensino médio, Francisco Cláudio Trindade, de
19 anos, faz parte da banda marcial da Escola Deodoro de Mendonça e diz
acreditar no ensino público. Mas diante de mais de um mês sem aulas, férias de
julho batendo à porta, conteúdos defasados e o vestibular chegando, ele está
cada vez mais preocupado.
Francisco pretende prestar vestibular para Turismo, na Universidade Federal do
Pará (UFPA). Ele afirma que tem se esforçado para não parar de estudar,
enquanto a greve perdura. Em casa, assiste a jornais na TV e, fora, faz
pesquisas em diversas fotntes, já que os livros didáticos não são suficientes.
Mesmo assim, o jovem vê diminuírem as chances de aprovação no processo
seletivo. Antes da greve, os estudantes do Deodoro de Mendonça tiveram apenas
um mês de aula por causa de obras estruturais que retardaram o início do ano
letivo. Fizeram, então, apenas a primeira avaliação.
Vamos fazer o vestibular sem saber o assunto. Se durante o ano inteiro já não
dá para ver toda a matéria, imagina com um mês sem conteúdo. Provavelmente
também ficaremos sem o simulado porque ele deveria ser feito em maio , lamenta
Francisco.
PERSEVERANÇA
Por outro lado, a especialista em Sociologia da Educação, Aparecida Nery Souza,
que leciona na Universidade de Campinas (Unicamp), pondera que nem tudo está
perdido, principalmente se houver o compromisso do professor grevista de repor
as aulas quando cessar a paralisação.
A professora lembra que o método de reposição de aulas é discutida
nacionalmente pelos profissionais da Educação. Uma alternativa seria o
professor replanejar suas aulas e não se prender ao modelo que deposita na
prova o seu modelo de avaliação. Ela não aponta fórmulas e diz que o ideal é
levar a discussão para a comunidade, através dos conselhos Escolares.
Mesmo soluções já experimentadas e criticadas podem ser adotadas se houver
aprovação de todos, como aulas aos sábados. Mas, segundo a vice-diretora do
turno da tarde na Escola Jarbas Passarinho, Sheila Valente, alguns alunos
alegam questões religiosas e culturais para faltar.
Para os estudantes que questionam o que fazer em relação ao programa do
vestibular, Aparecida recomenda aproveitar o tempo sem aula para procurar uma
biblioteca, ler os livros pedidos nos processos seletivos, formar grupos de
estudos e ampliar suas possibilidade lendo jornais, ouvindo música, assistindo
filme ou teatro.
Fato de não ter aula não é derrota total. A Escola é um dos espaços, talvez o
mais importante, mas se tem outros espaços importantes , diz.
Categoria sente-se pressionada pelo governo a voltar ao trabalho
Não houve acordo entre governo estadual e os professores, por isso, a greve nas
Escolas da rede pública estadual vai continuar, pelo menos, até a segunda-feira
(8), quando os grevistas se reunirão em assembleia geral, a partir das 9 horas.
A concentração será à porta da entrada da sede da Secretaria Estadual de
Educação (Seduc).
No início da manhã de ontem a secretária de Educação, Iracy Gallo, convocou uma
reunião com a coordenação do movimento, mas em apenas 20 minutos de discussão,
a comissão de professores se retirou da sala e anunciou a continuidade da
greve. Além da secretária, participaram da tentativa de acordo o representante
da Casa Civil, Jorge Panzera, secretário-adjunto, Fernando Azevedo, e a
secretária de Ensino, Socorro Brasil. A comissão de professores pretendia
garantir, pelo menos, o aumento no valor do abono do Fundo de Desenvolvimento
da Educação Básica (Fundeb) dos atuais R$ 126 para R$ 200 aos professores e dos
R$ 100 para R$ 140 para os técnicos administrativos. Mas, o governo não aceitou
e secretária avisou que se os professores não retomarem o calendário letivo,
haverá desconto dos dias parados durante a greve e ainda acusou o movimento
grevista de ser movido por força política e não da categoria.
Na saída da sala, o coordenador do Sindicato dos Trabalhadores de Educação
Pública do Pará (Sintepp), Eloy Borges, acusou o governo Ana Júlia Carepa de
ter uma postura arrogante e de perseguir os movimentos sociais. Eu avisei à
secretária que quem vai decidir se paramos ou continuamos a greve são os
professores e não a pressão da Seduc. Vamos provar que a nossa categoria tem
dignidade, é soberana e não vai se dobrar a nenhum governo , afirmou Borges.
Ele ainda ressaltou que o governo trata os trabalhadores como criminosos, a
exemplo da ação judicial movida pela Seduc, em que a Justiça determinou a
ilegalidade da greve, impondo multa se os professores não retornarem ao
trabalho e avisou que o Sintepp vai recorrer da decisão para cassar a liminar .
Esta é a marca que este governo vai deixar, de perseguição. Não é a marca de
investimentos na Educação nem de melhoria na qualidade do ensino, mas da
criminalização dos movimentos sociais , definiu Borges. E ainda alertou, Esse
governo vai saber o que é fazer política no próximo ano .
Iracy Gallo, entretanto, assegura que o governo cumpriu o acordo com os
professores para que eles desocupassem o prédio da Secretaria de Fazenda
(Sefa), invadido na terça-feira, concedendo reajuste de salário para a
categoria de até 12% para o nível superior.
O governo já concedeu os percentuais possíveis em tempo de crise. Hoje, nós
conclamos a categoria a voltar ao trabalho, mas eles foram irredutíveis. O
movimento utilizou a categoria de forma irresponsável porque esta greve é
política, pois todos os outros sindicatos fecharam o acordo, mas o Sintepp
prefere continuar prejudicando os estudantes , acusou a secretária de Educação.
Iracy Gallo assegurou que o governo quer o diálogo, mas a direção do Sintepp
exige um percentual de reajuste muito acima da capacidade de pagamento da
administração estadual. Ela também disse que a coordenação dos grevistas fechou
acordo apenas com o município de Belém, que ofereceu percentuais menores que o
Estado, outro indício de que a greve é movida por interesses políticos de um
pequeno grupo que domina o Sintepp. Nós vamos pagar os dias parados à medida em
que houver reposição das aulas. Isso irá acontecer quando a maioria retornar às
aulas e a grande maioria quer voltar a trabalhar porque tem compromisso com a
Educação pública , ressaltou Iracy Gallo.
Diferença salarial gera desacordo
Os professores reivindicam reajuste salarial de 30%, mas a Secretaria Estadual
de Educação (Seduc) fechou sua proposta em 12% para professores contratados com
nível Escolar fundamental, 9,93% para os de nível médio 6% a 7,5% para os de
nível superior.
O governo alega não ter condições de dar mais do que o exigido. Os professores
afirmam que o salário é pequeno para a função cumprida. Um professor com nível
superior ganha R$ 465 de salário-base para 100 horas e um com nível médio, R$
433.O vencimento é aumentado com as gratificações e abonos. A gratificação de
magistério, de 10%, e o abono de 20% pelas aulas suplementares são pagas a
todos. Mas o que faz a diferença é a gratificação de 80% para quem ingressou na
rede estadual com formação na universidade.