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quinta-feira, 22 de setembro de 2016

"Reforma do ensino médio pode mexer nos vestibulares, dizem especialistas"

Fonte: G1 Educação
22 de setembro de 2016

Proposta de flexibilizar ensino médio, que não vale para 2016, pode incluir a redução do currículo obrigatório das escolas e do que cai nas provas das universidades. MEC não confirmou informação.


Por Ana Carolina Moreno, do G1

A proposta de reforma do ensino médio que o governo federal deve anunciar na tarde desta quinta-feira (22) pode passar pela alterações de artigos da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) que definem as matérias obrigatórias do ensino médio, e das regras para as universidades elaborarem seus vestibulares. As informações são de especialistas ouvidos pelo G1 que tiveram acesso informal às discussões por trás da elaboração do texto da medida provisória, que deve ser apresentada nesta quinta em Brasília pelo presidente Michel Temer. No entanto, a proposta não vale para os processos seletivos de 2016, incluindo o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
De acordo com a assessoria de imprensa do Ministério da Educação, o texto da medida provisória ainda estava sendo fechado no início da noite desta quarta-feira (21), e deve ser apresentado a Temer na manhã desta quinta. Às 15h, um evento está marcado com uma série de entidades da área educacional. O conteúdo, até agora, só foi divulgado em linhas muito gerais pelo ministro Mendonça Filho, e até o conselheiro nacional de Educação Cesar Callegari, que preside a comissão que avaliará e aprovará a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), afirmou ao G1 que não teve acesso prévio ao texto.
Entre as entidades convidadas para o evento desta quinta está a Associação Brasileira de Escolas Particulares (Abepar). Em entrevista ao G1, Arthur Fonseca Filho, diretor da Abepar e ex-conselheiro nacional de Educação, afirmou que foi consultado informalmente sobre pontos da medida provisória durante a sua elaboração. De acordo com ele, que disse não ter visto a versão final do documento, a proposta gira em torno do "enxugamento" do conteúdo obrigatório do ensino médio e, para tornar isso possível, a ideia é alterar a forma como os vestibulares exigem esse conteúdo em suas provas. Outras pessoas ligadas à área de educação afirmaram que a base da proposta seria essa, mas que ela ainda não era consenso dentro do governo na noite desta quarta.
Procurado pelo G1, o MEC afirmou que não confirmaria "nenhuma informação que não seja oficial", e que as informações oficiais só serão divulgadas na tarde desta quinta.
Alteração da LDB
De acordo com Fonseca, a proposta que estava sendo estudada pelo governo segue linha semelhante à que vem sendo discutida desde 2013 por um grupo de especialistas em educação, que começou a estudar alternativas de estruturas curriculares do ensino médio de outros países, como os Estados Unidos. O grupo inclui a atual secretária-executiva do MEC, Maria Helena Guimarães de Castro.
Segundo ele, no decorrer dos anos, a LDB acabou sendo alvo de diversas emendas que acabaram "engessando" o ensino médio por meio da obrigatoriedade de um grande número de disciplinas. Ao mesmo tempo, o currículo acabou se voltando cada vez mais às exigências das universidades na seleção de calouros. "Durante os últimos anos, montes de emendas foram feitas, incluindo diversos componentes curriculares, tornando esses componentes obrigatórios", explicou ele. "Vai haver um 'enxugamento' disso, voltando ao texto original das quatro grandes áreas [ciências humanas, ciências da natureza, linguagens e matemática]. O equivalente a mais ou menos um terço do tempo [carga horária] do ensino médio seria destinado à Base Nacional Comum, que ainda não está aprovada. Com isso, os outros dois terços ficam muito mais livres. E quando digo livres, ninguém está impondo uma mudança qualquer. Eventualmente, se uma escola achar que está ótimo, não precisa [alterar o currículo]."
O "engessamento" do ensino médio também é usado pelo MEC como motivo para defender uma reforma nessa etapa da educação básica. Fonseca explica, porém, que, para conseguir "flexibilizar" o conteúdo do ensino médio, a pasta considera alterar a formulação dos processos seletivos de ingresso no ensino superior, que acabam tendo influência no currículo do ensino médio.
Na LDB, o artigo que define a relação entre os vestibulares e o ensino médio é o 51º. Ele afirma que as instituições de ensino superior, na hora de definir os critérios da seleção dos estudantes, devem levar em conta "os efeitos desses critérios sobre a orientação do ensino médio, articulando-se com os órgãos normativos dos sistemas de ensino". Segundo Fonseca, da Abepar, a proposta da medida provisória pode passar por uma mudança nesse texto, fazendo com que esses critérios precisem seguir apenas o conteúdo obrigatório definido pela Base Nacional Curricular Comum. Em teoria, isso permitiria ao ensino médio uma liberdade maior em relação ao vestibular – o que deixaria espaço para outros tipos de atividades de caráter opcional paras as escolas e redes.
De acordo com Fonseca, é essa a mudança que permitiria às escolas adotar modelos de ensino médio integrados com o ensino profissionalizante, por exemplo.
Educação acima do Congresso
Callegari, conselheiro do CNE, afirmou ao G1 que não leu o texto da medida provisória e que defende a "audácia" para "o fracasso do ensino médio", mas que já se posicionou publicamente contra a aprovação de leis que versem sobre o currículo pedagógico das escolas. Além disso, segundo ele, a LDB já é flexível o suficiente para contemplar as propostas que criticam o "engessamento" das disciplinas. "É evidente que estamos no meio de uma crise crônica. A gente não pode ficar parado no lugar. Temos que dar um passo, mas vamos dar o passo certo", disse.
"É correto o que vem sendo discutido sobre começar a pensar menos em disciplinas, e mais em áreas do conhecimento. É positivo. Mas uma preocupação que eu tenho é que a resposta a um número excessivo de disciplinas seja uma simplificação rasa, que estreite o currículo apenas em disciplinas meramente utilitárias. Elas são importantes, mas não são suficientes. Tenho essa preocupação de que a ideia de uma flexibilização diminua e amesquinhe a formação do jovem brasileiro, que, antes de mais nada, precisa ser um cidadão do mundo", explicou o conselheiro. O efeito dessa redução para dar espaço a atividades optativas pode ter resultados contrários aos desejados, alerta ele. "Para o propósito de flexibilizar, eu reduzo o conhecimento. Esse é o problema. No lugar, esse conhecimento pode ser substituído por nada, ou muito pouco. Esse é um risco que existe."
Ele discordou, também, da ideia de que o ensino médio esteja engessado. "Hoje a legislação vigente – a LDB e as próprias diretrizes curriculares – já asseguram que os sistemas de ensino e as escolas possam flexibilizar, possam fazer várias modelagens curriculares. (...) As únicas coisas que ficam presas por conta da legislação complementar é a obrigatoriedade de filosofia e sociologia [citadas no artigo 36º da lei, inciso IV]. No fundo, são as únicas disciplinas de fato obrigatórias em cada um dos três anos do ensino médio." Para Callegari, há outras soluções para reformar a estrutura do ensino médio sem a necessidade de alteração da lei. Uma delas é a "educação baseada em projetos" que integra professores de disciplinas diferentes. "É uma maneira de você resolver a excessiva fragmentação disciplinar. Não é eliminando conhecimento nem conteúdo, é fazendo com que esse conhecimento se integre de forma significativa à vida desses alunos."
A alteração do artigo que define orientações para o vestibular também é desnecessária, segundo ele, agora que o Brasil está próximo de finalizar a elaboração da Base Nacional Curricular. "O carro está na frente dos bois: em vez de o currículo definir as avaliações, são as avaliações que definem o currículo, por falta de um currículo nacional. O que não podemos imaginar é que [os vestibulares] vão ficar proibidos de fazer exigências do processo seletivo de alunos. Não têm que ficar proibidos de nada, os alunos é que têm que ter capacidade de enfrentarem as coisas."
"O Congresso tem lados, é um jogo de poder. Acho que a educação, sobretudo a organização curricular das escolas, tem que ficar acima desse jogo político-partidário"
O conselheiro também se diz contra a definição e alteração de conteúdos curriculares por meio de leis, e defende que essa área da educação seja debatida e decidida pela sociedade e pelos especialistas e trabalhadores da área, como professores e dirigentes, como acontece com a Base. "A medida provisória é um projeto de lei com efeito imediato. Mas ela será convertida em lei. Quando for apreciada [pelos deputadores e senadores], vai certamente receber emendas. O Congresso tem lados, é um jogo de poder. Acho que a educação, sobretudo a organização curricular das escolas, tem que ficar acima desse jogo político-partidário."

"País tem o dever de trazer de volta aqueles que desistiram da escola"

Fonte: Uol Notícias
22 de setembro de 2016

Gary Stahl

Especial para o UOL


divulgação do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) revela um cenário preocupante: os adolescentes e os jovens brasileiros não estão desenvolvendo nem metade de seus potenciais de aprendizagem. Nos anos finais do ensino fundamental, o país tem nota 4,5. Já no ensino médio, o cenário é ainda mais grave, visto que, há quatro anos, o Ideb não ultrapassa os 3,7.
Embora o Ideb não possa ser usado como único indicador para analisar o cenário educacional brasileiro, ele traz importantes alertas que precisam ser levados em conta. Os números mostram que a melhoria do acesso à escola –conquista que o Brasil não deve abrir mão– não veio acompanhada da qualidade necessária. O país ainda tem uma grande dívida social com suas crianças e, em especial, com os adolescentes. São estes os que mais sofrem com a baixa qualidade do ensino.
Os dados que foram divulgados confirmam um alerta que o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) vem fazendo nos últimos dez anos: os investimentos na primeira infância só se consolidam se forem mantidos nas demais etapas da vida. O foco na infância é essencial para o desenvolvimento humano, e é preciso investir mais e com mais eficiência.
Na educação, estamos diante de uma situação em que as melhorias produzidas nos anos iniciais do ensino fundamental –que vão do 1º ao 5º ano– não são observadas nas etapas seguintes. Baixos níveis de aprendizagem, altos índices de distorção idade-série (atraso escolar), abandono e evasão fazem parte do atual cenário a que são expostos adolescentes e jovens.
Para muitos, a escola não é atrativa. Falta conexão entre aquilo que se aprende nas salas de aula com um projeto de vida junto da realidade desses meninos e meninas. Prova disso são as inúmeras ocupações de escolas que têm sido vistas pelo país, desde o final de 2015. Ao mesmo tempo, falta investimento nos professores e na valorização da carreira docente, na infraestrutura escolar e também no desenvolvimento e na disseminação de boas práticas e de pesquisas pedagógicas.
É preciso dar atenção às crianças e aos adolescentes que estão fora da escola, sendo a maioria oriunda de populações vulneráveis. São meninos e meninas negros, indígenas, quilombolas, pobres, do campo, sob risco de violência e de exploração e/ou com deficiência. É preciso também olhar para as crianças e para os adolescentes que, dentro da escola, não têm garantido seu direito de aprender devido a diversas razões e vulnerabilidades. Um dos principais fatores de risco para a permanência das crianças na escola é o fracasso escolar, representado pela repetência, o que provoca elevadas taxas de distorção idade-série.
O país tem o dever de garantir a aprendizagem de quem está na escola e trazer de volta aqueles que desistiram. Porém, não basta resgatar esses adolescentes e jovens e oferecer a eles o mesmo modelo de ensino. É preciso fazer da escola um espaço de cultura que respeite as linguagens e as dinâmicas dos meninos e das meninas que estão nessa etapa de escolarização. A escola tem que se voltar mais à interação e às práticas pedagógicas capazes de estimular essa geração a contribuir para o desafio de construir um ensino médio de qualidade, algo tão essencial para o Brasil.
Para todas as etapas, vale o mesmo princípio: valorização dos professores, mais investimento, mais consistência pedagógica, e mais comprometimento político. Nesse sentido, a melhor representação da vontade política de um governo não é o número de projetos de lei aprovados para incluir ou para proibir conteúdos nas escolas, mas a quantidade de recursos realmente investidos para fazer acontecer as mudanças necessárias na educação, que são a base para um desenvolvimento sustentável de, sem exceção, qualquer nação.
Não há soluções mágicas. Trata-se de medidas conhecidas, que começam pela garantia da universalização do acesso a todos os ciclos da educação básica. Contudo, o Unicef está convencido de que essa universalização apenas se tornará realidade com uma educação de qualidade que, por sua vez, só será possível com investimentos, com a produção de conhecimento e, é claro, com o envolvimento da comunidade e a participação ativa dos estudantes. A educação de qualidade para cada criança e cada adolescente precisa ser, de fato, uma prioridade nacional.

"Educação no foco"

Fonte: Estadão
22 de setembro de 2016

Governo acelera reforma do ensino médio e se arma para batalha da PEC de gastos

Cida Damasco

Por falta de indicadores não é que a Educação no Brasil está onde está. Há hoje uma série de estudos esmiuçando como caminha o setor, onde se localizam os principais gargalos e os principais avanços. Nos últimos dias, pelo menos duas levas de estatísticas foram divulgadas e só comprovaram o que o bom senso sugere, ou seja, que o País ainda está longe de uma posição confortável em termos de Educação.
É o caso do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que acompanha o desempenho dos estudantes em língua portuguesa e matemática, e do “Education at a Glance”, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que mede a evolução do setor em 41 países.
O que falta é uma política pública adequada para reverter esses indicadores com mais eficiência e rapidez. A julgar pelos discursos de campanha de candidatos a qualquer cargo eletivo, a Educação é a prioridade das prioridades para dar impulso ao crescimento do País. Mas, quando são postas à prova, essas promessas quase sempre não se sustentam. Basta ver como alguns ocupantes das pastas de Educação são indicados – naquela cota de agrados aos partidos da coalização. Mesmo políticos do primeiro time olham com descaso para a Educação, preferindo se alojar nos ministérios “que furam poço”, ou seja, aqueles que têm mais verbas e obras físicas para fazer alarde junto ao eleitorado.
Nesse sentido, vem em boa hora a decisão do governo Temer de editar uma MP para apressar a entrada em vigor da reforma do ensino médio. Inicialmente prevista para ser projeto de lei, a reformulação acabou virando MP, para não concorrer com outros temas na congestionada pauta do Congresso. Os objetivos são, em resumo, flexibilizar os currículos escolares, com a combinação de matérias obrigatórias e outras mais ligadas a interesses específicos dos alunos, ampliar a jornada escolar e reforçar o ensino profissionalizante.
Pelas lentes do Ideb 2015, é possível verificar que o ensino médio está estagnado desde 2011 e abaixo da meta fixada pelo Ministério da Educação: a nota é de 3,7, numa escala de 1 a 10, frente a um objetivo de 4,3. Só dois Estados, Amazonas e Pernambuco, conseguiram atingir o alvo. Na rede privada, sempre considerada um oásis, a nota obtida em 2015 foi a mais baixa da série histórica, iniciada em 2005.
Na comparação com o grupo da OCDE, embora se constate uma melhora em relação às edições anteriores, o Brasil também continua em desvantagem. Também aí aparece o gargalo do ensino médio. Em 2013, mais da metade da população de 25 a 64 anos não havia concluído o ensino médio, enquanto a média geral era de 24%. No ensino profissionalizante, o desnível é ainda maior. Só 8% das matrículas no ensino médio no Brasil referem-se a essa modalidade de curso – a terceira menor participação entre os 41 países.
Mas, se a urgência para mudar o ensino médio é praticamente um consenso, o mesmo não ocorre com a política que se desenha para os investimentos na educação. É verdade que, no estudo da OCDE, fica visível que o problema do financiamento da educação no Brasil não se resume ao quanto se gasta, mas inclui também o como se gasta. Vamos às contradições: em 2013, o Brasil aplicou na Educação 16% do total de gastos públicos, cinco pontos acima da média da OCDE. Parece muito? Quando se desce ao investimento por aluno, no entanto, a realidade é bem mais sombria. Enquanto o investimento por aluno no ensino fundamental e médio é equivalente a cerca de US$ 3,8 mil anuais, entre os mais baixos registrados no levantamento, no ensino superior sobe para US$ 13,5 mil, e chega perto da média de US$ 15,8 mil.
Diante desses números, esquenta o debate sobre a decisão de submeter as áreas sociais, incluindo a Educação, aos limites gerais impostos na PEC do teto do gasto público. Para especialistas, o risco de uma abordagem excessivamente “fiscalista” da questão é nivelar a educação por baixo e não eliminar as distorções já existentes.

"Análise: Reforma no ensino médio não toca em acesso à internet e salário do professor"

Fonte: Estadão
22 de setembro de 2016

'Não podemos ter um mar de precariedade com poucas escolas estaduais de excelência para alunos selecionados'

Paulo Carrano

Análise: Reforma no ensino médio não toca em acesso à internet e salário do professor
Ensino médio passará por reformulação 
Como o problema do ensino médio é estrutural, não será resolvido com soluções não estruturais. Essa etapa tem uma série de dificuldades, principalmente desde a expansão irregular da década de 1990, em que se recebeu público mais amplo: popular e negro.
Anteriormente, ensino médio era pensado só para elite. Mudanças são necessárias, mas a flexibilização proposta para um público tão desigual pode fragilizar a formação. O que significa flexibilizar para alunos com histórico de dificuldades de aprendizagem? Além disso, a comunidade do ensino médio está sendo solapada dessa discussão. Não dá para tomar o atalho da medida provisória.
Essa reforma - pelo que se sabe até agora - não toca na adequação de laboratórios, no acesso à internet, no salário do professor ou sua falta de tempo para planejar aulas. Não podemos ter um mar de precariedade com poucas escolas estaduais de excelência para alunos selecionados. 
A ideia aparentemente sedutora de flexibilizar pode levar à formação aligeirada, excessivamente preocupada com necessidades do mundo do trabalho, sem resolver o problema da evasão. O eventual aumento de carga horária na escola precarizada também é pior.
A possibilidade de dividir os conteúdos por eixos - Linguagens, Matemática, Ciências Humanas e Ciências da Natureza - é interessante. Devemos compreender que os conhecimentos estão conectados em rede. Mas há um caminho anterior a se fazer, de garantir que os professores sejam formados nessa transdisciplinaridade.

PAULO CARRANO É PROFESSOR DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE (UFF) E COORDENADOR DO OBSERVATÓRIO JOVEM

"Reforma de Temer do ensino médio deve ampliar escola integral"

Fonte: Folha de São Paulo
22 de setembro de 2016


Acessar em: http://www1.folha.uol.com.br/educacao/2016/09/1815683-reforma-de-temer-do-ensino-medio-deve-ampliar-escola-integral.shtml


"Ensino Médio deve ter currículo flexível e carga horária maio"

Fonte: Zero Hora (RS)
22 de setembro de 2016

Mudanças devem ser anunciadas hoje pelo governo federal em medida provisória. Especialistas questionam falta de consulta e de conhecimento sobre o texto


Por: Jeniffer Gularte, Bruna Vargas e Guilherme Mazui

Uma discussão de anos sobre mudanças no Ensino Médio em todo o Brasil pode ser abreviada sem a participação de alguns dos principais envolvidos nesta quinta-feira. Com um projeto de lei sobre o tema tramitando no Congresso desde 2013, ainda sem data para votação, as definições que prometem impactar a vida de milhões de estudantes devem partir de uma medida provisória (MP) editada por Michel Temer. O anúncio está previsto para ocorrer às 15h, após uma reunião entre o presidente e o ministro da Educação, Mendonça Filho (DEM-PE).

Para o titular da Educação, os maus resultados em avaliações, como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), justificam a pressa nas mudanças.
– A medida provisória trata de matérias urgentes e relevantes. O flagelo que vive a educação brasileira, particularmente o Ensino Médio, mostra a necessidade de agir com velocidade. Há três anos discutimos um projeto no Parlamento e ele não avança – disse.
Diante da iminência do anúncio, o governo federal convocou, nesta semana, representantes estaduais das secretarias de Educação para falar sobre o conteúdo do documento. A secretária-adjunta do Rio Grande do Sul, Iara Wortmann, foi enviada a Brasília, onde participou de reuniões na quarta-feira – cujo conteúdo dividirá com os colegas depois do retorno ao RS. 
– Nós não temos conhecimento do que vai ser determinado. A definição por MP causa um pouco de estranheza, mas temos de ver o que virá como justificativa – disse a diretora do departamento pedagógico da Secretaria Estadual de Educação (Seduc), Márcia Coiro.
Se as unidades estaduais foram convocadas às pressas para serem inteiradas do assunto, entidades que representam escolas, professores e estudantes sequer tomaram conhecimento do conteúdo da MP. A um dia do anúncio, dizem não ter sido consultadas nem convidadas a participar da discussão. 
– É preocupante que isso aconteça sem a discussão da comunidade escolar. Essa forma de promover mudanças, de cima para baixo, não vai resolver nossos problemas, porque não são essas pessoas que vão operar a educação no Brasil – avaliou a diretora do Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinpro-RS), Cecília Farias. 
Pressa comprometeria eficiência do processo
O presidente do Conselho Estadual de Educação, Domingos Buffon, contou que a entidade também não foi consultada sobre a MP, e que as informações que tem sobre o conteúdo da Medida Provisória são apenas aquelas divulgadas pela imprensa. Ele acredita que o dispositivo não é o modo mais adequado de implementar uma mudança dessa dimensão.
– É um tema muito sério para se pensar em resolver sem uma discussão mais ampla com a sociedade – avalia Buffon.
Visão semelhante foi compartilhada por Bruno Eizerik, presidente do Sindicato do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinepe/RS) e vice-presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep). Nenhuma das duas instituições participou de discussões sobre as alterações, que devem começar em 2017. 
– Lamentamos que uma mudança tão importante, que envolve o futuro do nosso país, não tenha sido dialogada com o setor privado. Ninguém questiona a necessidade de mudança, mas isso precisa ser melhor construído – opinou. 
Presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Eduardo Deschamps acredita que houve o debate necessário, pois o assunto já era tratado no governo Dilma Rousseff. Ele adianta que o projeto de lei que tramita no Congresso serviu de base para a reforma anunciada por Temer. Assim, os governos estaduais estariam cientes das diretrizes das mudanças.
– O Consed, desde 2012, discute o tema com MEC. Conversarmos com técnicos e deputados, participamos de audiências. É uma revolução o que vai acontecer – elogiou.

Se as entidades criticam a postura do Planalto em apressar a reforma, o governo federal não considera problemática a ausência de setores diretamente envolvidos com o tema na definição. Isso porque a MP é baseada no Projeto de Lei (PL) 6.840/2013, que nos últimos três anos já teria sido alvo de discussões com representantes de entidades, o que foi considerado suficiente por Mendonça Filho para implementar as mudanças. 
Pontos como o sistema modular, em que o aluno pode obter certificados parciais, e a flexibilização do currículo, que teria uma base comum na primeira metade e seguiria "aberto", com a possibilidade de o aluno escolher uma área de ênfase, constavam no projeto de lei. A MP deve abordar questões ainda menos novas, como a divisão das disciplinas por áreas do conhecimento, prevista em uma resolução desde 2012.
Para a professora da Faculdade de Educação da UFRGS Maria Beatriz Luce, a aprovação de uma reforma por medida provisória é "surpreendente" porque, além de abordar questões discutidas há anos – algumas delas já previstas em lei –, não garante que escolas irão se enquadrar no novo modelo. Ela acredita que um debate mais abrangente traria à tona problemas que já impedem a implantação de medidas hoje, como a falta de infraestrutura e mudanças necessárias na formação dos professores, ainda voltada para um modelo antigo de ensino. 
– Nada disso (que deve constar na MP) é impedido hoje. Só não tem força mandatória. A questão do currículo flexível, por exemplo, é dificultada porque as escolas não têm estrutura e corpo docente para oferecer isso. Estou aguardando mais informações sobre o que constará no texto para saber se ele vai se relacionar com a legislação vigente e com as normas curriculares já existentes – diz. 
O doutor em educação Roberto Rafael Dias da Silva, que estuda o currículo do Ensino Médio, também acredita que a falta de "paciência" com a questão pode não resultar em mudanças efetivas e em uma reforma que seja positiva para a sociedade. Para ele, o governo citar o mau desempenho do Ensino Médio no Ideb de 2015 – a média foi de 3,7, abaixo da meta, de 4,3 – como argumento para a aprovação de uma MP é insuficiente e inibe uma discussão fundamental sobre os objetivos da educação no Brasil:
– Mais importante do que decidir como será o currículo é definir qual é o propósito da escola. Senão, vamos nos perder em meio a tantas demandas, como mercado de trabalho e Ideb. O mercado é perecível. Quando o jovem for ingressar no mundo do trabalho, esse mundo já será outro, e ele também. Temos de restabelecer o debate público sobre a formação, fazer da educação algo comum.
Gerente de conteúdo do movimento Todos Pela Educação (TPE), Ricardo Salzetta considera a MP inadequada para definir as mudanças, mas prefere aguardar o texto para comentá-la, até porque ele acredita que a base da medida deve ser o projeto de lei que tramita no Congresso e cujo conteúdo o TPE ajudou a formular.
– MP não combina com educação. O ideal seria acelerar o projeto que já está tramitando – avalia.

Flexibilização e desigualdade social
O coordenador de pesquisas do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), Antonio Augusto Gomes Batista, acredita que a redução de disciplinas é necessária, mas avalia que a flexibilização do currículos, com a possibilidade de os alunos fazerem suas próprias escolhas, pode aumentar ainda mais a desigualdade em um país que já tem fortes diferenças sociais. 
Os reflexos, segundo ele, seriam maiores principalmente nas escolas públicas, onde as condições de vida dos jovens mais pobres fariam com que eles fizessem suas escolhas condicionadas a sua realidade: 
– As escolhas desses jovens tendem a ser mais limitadas. Serão escolhas feitas a partir do que eles enxergam como possível, do que eles veem acontecer com as pessoas que são iguais a eles. 

"MP prevê ensino médio de 1.400 h/ano, menos disciplinas e curso 50% opcional"

Fonte: Estadão Educação 
22 de Setembro de 2016 

Mudança por Medida Provisória causa críticas em relação à falta de debate. Texto prévio sugere módulos semestrais e possibilidade de trancar curso

Luísa Martins, Carla Araújo e Luiz Fernando Toledo,
O Estado de S. Paulo

Foto: Elza Fiuza/Agência Brasil
MP prevê ensino médio de 1.400 horas, menos disciplinas e curso 50% opcional
O projeto ainda prevê que alunos que tenham cursos de inglês ou informática serão dispensado das aulas, mediante certificado de conclusão.
O governo Michel Temer divulga nesta quinta-feira, 22, a maior mudança da educação brasileira em 20 anos, desde a criação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Com o desempenho ruim dos alunos nas avaliações recentes, e sem previsão de avanços no Congresso, a reforma do ensino médio virá por Medida Provisória, estabelecendo a partir de 2017 mais horas de aulas e menos disciplinas, com metade do curso montado pelo aluno.
A reformulação tem o objetivo de evitar a evasão escolar e melhorar a qualidade. Com a nova proposta, a carga horária passa de 800 para 1,4 mil horas/ano –, exigindo turno integral. O currículo, que hoje abarca 13 disciplinas obrigatórias, também sofrerá modificações. Durante todo o primeiro ano e metade do segundo, o estudante seguirá aprendendo o básico de cada matéria, com base nos pilares que já norteiam o Exame Nacional de Ensino Médio (Enem): Linguagens, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Matemática. No ano e meio seguinte, porém, ele terá mais flexibilidade para priorizar assuntos que sejam da sua área de interesse para um futuro ensino técnico ou superior. Por exemplo: se o aluno quiser ser engenheiro, o programa aprofundará as disciplinas de Exatas.
Reações. A medida já vem causando polêmica entre entidades do setor, por causa do “atalho” proposto pelo ministro da Educação, Mendonça Filho, ou seja, o fato de propor as mudanças por meio de Medida Provisória (que vigora a partir da publicação no Diário Oficial da União) e não projeto de lei, com trâmite no Congresso e discussão mais ampla. Convencido pelo ministro da “necessidade urgente de mudar a arquitetura legal” desta etapa da educação básica, o presidente Michel Temer aceitou editar a MP. “Há um senso forte de urgência”, justificou Mendonça em fala no plenário da Câmara dos Deputados nesta quarta, em sessão solene comemorativa aos 10 anos do movimento Todos Pela Educação.
Segundo ele, a reformulação será implementada pelas redes estaduais de forma gradual e ainda não há prazo definido para que todas as escolas estejam plenamente de acordo com o que preconiza o texto. “O mais determinante é o engajamento e o compromisso dos Estados em colocar tudo em prática, uma vez que o Brasil é o país das leis que não pegam. Mas conversei com vários secretários e a adesão é fortíssima, maior do que se esperava”, disse ao Estado a presidente executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz, salientando que a diversificação das trajetórias formativas é um dos pontos principais para melhorar o ensino médio. 
Para o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Eduardo Deschamps, ao ver que o conteúdo aprendido pode realmente ter aplicabilidade na vida prática o aluno se sentirá mais interessado e motivado a continuar o ensino médio.
Semestral, com trancamento. Mendonça Filho ainda disse a outros interlocutores que a MP que será editada nesta quinta “reflete 99%” do que já foi discutido no âmbito do Consed, que vem debatendo a proposta há mais de dois anos. A área de educação do governo, porém, tem tentado evitar “vazamentos” sobre o conteúdo da MP. Isso para não esvaziar o ato oficial de lançamento, que será nesta quinta às 15 horas, quando Temer volta de sua participação na Assembleia-Geral das Nações Unidas.
Estado teve acesso a um detalhamento enviado a integrantes do Conselho Estadual de Educação de São Paulo e especialistas da área. Nesse, afirma-se que o ensino médio funcionará em sistema modular com obtenção de certificados parciais. O aluno poderá trancar a matrícula ao fim do semestre e retomar os estudos posteriormente daquele ponto. Confrontado especificamente sobre isso, Mendonça negou.
A proposta enviada ainda prevê que 50% do currículo será obrigatório e comum nacionalmente; os outros 50%, ficarão a cargo dos sistemas estaduais, incluindo a formação técnica profissionalizante (como parte complementar às matérias). O texto em discussão, que repete em vários pontos o PL 6840/13 na Câmara, ainda apresenta mais temas transversais, como educação sexual, e a possibilidade de incluir uma terceira língua no currículo. O MEC só comentará a MP nesta quinta.
Docência poderá ser por ‘notório saber’
Segundo fontes do Ministério da Educação (MEC), para reduzir o déficit de professores, a pasta também deve permitir a contratação de docentes com “notório saber”, ou seja, quem leciona Matemática não necessariamente precisará ter formação na disciplina – poderá ser em Física, por exemplo. Hoje os cursos de licenciatura no País habilitam o profissional a atuar como professor na educação infantil, no ensino fundamental e no ensino médio.

"Governo apresenta Medida Provisória para mudar ensino médio"

Fonte: Bom Dia Brasil Rede Globo
22 de setembro de 2016

Aluno terá mais horas de aula, menos disciplinas e pode montar o curso. 
Na quarta (21), movimento Todos pela Educação fez um ato na Câmara.


 governo apresenta, nesta quinta-feira (22), a Medida Provisória do ensino médio. O aluno terá mais horas de aula, menos disciplinas e poderá escolher metade do curso. A mudança será apresentada por Medida Provisória para começar a valer logo.
O novo ensino médio será em tempo integral. A carga horária vai subir de 800 para 1400 horas anuais. Durante todo o primeiro ano e metade do segundo, o estudante vai seguir currículo básico. Depois vai focar em matérias de interesses dele e vai ter cinco possibilidades.
Assista à reportagem completa no vídeo acima.

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

"‘A revolução no ensino se impõe pelas crianças’, diz António Nóvoa "

Fonte: O Globo Educação
21 de setembro de 2016

RIO — Autor de diversos livros e artigos sobre o ensino, o português António Nóvoa vê nas universidades brasileiras um compromisso reduzido com formação de professores para a educação básica. Por conta disso, o sociólogo defende a criação de um “lugar institucional que assuma a responsabilidade de formar professores”. O educador vai fazer uma das quatro conferências magnas do encontro Educação 360, que será realizado, de sexta-feira a sábado, pelos jornais O GLOBO e “Extra”, em parceria com o Sesc e a Prefeitura do Rio e apoio da Coca-Cola Brasil, da TV Globo e do Canal Futura, na Escola Sesc de Ensino Médio, em Jacarepaguá. As inscrições estão abertas e podem ser feitas por meio do site Educacao360.com.

Qual é o problema central na formação do docente?
O Brasil tem um sistema de formação de professores que precisa de alterações profundas. Por um lado, há um conjunto de boas universidades, sobretudo públicas, mas que não têm assumido um compromisso forte com a educação básica. Nelas, a formação de professores está muito fragmentada, entre diversas licenciaturas, lecionadas em diferentes institutos e faculdades, tornando impossível dar uma coerência à formação docente. Por outro lado, há uma realidade muito problemática que é a forma como se multiplicaram instituições privadas que, apesar de notáveis exceções, têm pouca qualidade e recorrem de forma muito generalizada, e medíocre, a cursos de educação a distância. Não é este o caminho para qualificar os professores e para dignificar a profissão docente.
Como resolver?
Venho advogando a necessidade da criação de um “lugar institucional”, dentro das universidades, que assuma a responsabilidade de formar os professores. Neste “lugar” deve haver também uma forte presença das escolas e dos professores, permitindo que os estudantes das licenciaturas se socializem profissionalmente desde o primeiro ano, isto é, eles vão adquirindo uma cultura profissional docente.

Qual é a proposta do senhor para a formação continuada?
A formação continuada não se faz através de cursos, de seminários ou de palestras nos quais os professores são bombardeados com todo o tipo de fastfood, de receitas, de modas. Esses eventos até podem ter uma função de convívio entre os professores ou de contato com ideias e autores que marcam o campo docente. Mas não são formação continuada. A formação continuada se faz dentro da profissão, através de uma reflexão sobre a experiência e o trabalho docente, procurando as melhores soluções, os melhores caminhos, para a educação dos nossos alunos. Como é que trabalhamos? O que fazemos bem? Onde estão as nossas dificuldades? Como superá-las? O que precisamos fazer diferente? Como aprender com os outros? É nesta interrogação e no diálogo com nossos colegas que podemos encontrar uma formação continuada baseada na cooperação. Na cooperação e na criação, isto é, numa reflexão e pesquisa sobre o trabalho docente.

Como descreveria a terceira grande revolução da Humanidade?
Michel Serres fala do digital como a terceira revolução na história da Humanidade. A primeira foi a escrita. A segunda, o livro. A terceira, o digital. O que interessa não é a tecnologia pela tecnologia, mas as mudanças que o digital provoca na forma como as crianças pensam, como usam o cérebro, como acessam o conhecimento, como se relacionam e como se comunicam. Estas mudanças trazem uma verdadeira revolução na aprendizagem e, obviamente, na escola.

Qual é o potencial das tecnologias na educação?
Há dois temas que atravessam o imaginário educativo há muitos e muitos anos. Por um lado, a autonomia dos educandos, isto é, a possibilidade de cada aluno acessar o conhecimento de forma autônoma e individualizada. Por outro lado, a importância de ligar a escola ao seu exterior, de investir o conjunto das possibilidades educativas que existem numa determinada sociedade, dentro e fora da escola. É óbvio, para todos nós, que o uso inteligente das tecnologias pode facilitar, e muito, a concretização destes dois ideais.

Ela nos leva para um momento melhor ou pior?
Não sabemos. Isso depende de nós, e não das tecnologias. É essencial compreender a importância do conhecimento e, sobretudo, que os alunos têm que aprender as linguagens (científica, literária e artística) que lhes permitam acessar o mundo, a todos os mundos que o digital nos abre. É possível que estejamos, pela primeira vez na história da escola, perante uma “revolução de baixo”. Até hoje, as mudanças foram sempre pensadas a partir “de cima”, pelos reformadores, pelos políticos, pelos pedagogos. Agora, a revolução se impõe “de baixo”, pela forma como as crianças pensam e acedem ao conhecimento. Elas estão nos obrigando a mudar as escolas e a educação.

De que forma a educação mudará nessa nova era?
Deixe-me falar dos quatro grandes princípios da Educação Nova, que influenciaram todo o pensamento educativo ao longo do século XX. (1) A diferenciação pedagógica, isto é, a ideia de que a escola deve ser construída à medida de cada aluno, favorecendo percursos e ritmos próprios de aprendizagem, em vez de darmos a mesma escola a todos os alunos; (2) A escola do trabalho, não no sentido da formação profissional, mas na perspectiva de uma escola onde alunos e professores trabalham em conjunto na construção dos processos de aprendizagem; (3) A pedagogia do diálogo, do encontro, da relação entre alunos, entre alunos e professores, e até entre o que está dentro e o que está fora da escola, a ideia de que ao valorizarmos a comunicação damos um sentido às aprendizagens; (4) A lógica da descoberta, da procura, da pesquisa, a ideia de que devemos despertar a curiosidade dos alunos para que busquem o conhecimento, em vez de lhes servirmos as matérias de forma passiva, sem a sua participação e envolvimento. Quando pensamos nesses quatro princípios, repetidos exaustivamente ao longo do século XX, não podemos deixar de reconhecer que eles ficaram largamente por cumprir nas nossas escolas.

Por quê?
Porque apesar da vontade de muitos educadores, a estrutura física e organizacional das nossas escolas não permitia nem a diferenciação, nem o trabalho conjunto, nem o diálogo, nem a descoberta. Muito pelo contrário. A organização da sala de aula, do mobiliário, da estrutura do espaço e do tempo, impedia a concretização destes quatro princípios. Se formos otimistas, podemos admitir que as tecnologias, e tudo o que nelas reorganiza os espaços e as formas de relação com o conhecimento, nos permitem imaginar um outro espaço educativo, mais diverso, mais aberto, com lugares para a individualização, para o trabalho conjunto, para o diálogo e para a pesquisa. É em torno desses quatro pilares, definidos por quatro C’s, que podemos imaginar o que serão os ambientes das escolas do “futuro presente”.

Quais são os quatros C’s?
(1) Caminhos personalizados. Em vez da escola uniforme e homogênea, normalizada, temos de buscar percursos individualizados, a diferenciação pedagógica de que falamos há tanto tempo, e as tecnologias podem ajudar-nos nesta busca; (2) Cooperação. O desenvolvimento de formas de cooperação e de trabalho conjunto, no estudo de grandes problemas e temas de convergência, e não apenas em torno das disciplinas, permitem-nos construir uma pedagogia do trabalho que as novas tecnologias tornam mais fácil; (3) Comunicação. A aposta em dinâmicas de comunicação, fortemente potenciadas pelas novas tecnologias, é central para uma pedagogia ancorada em interações e relações, em formas de expressão e de comunicação que dão sentido às aprendizagens escolares; (4) Criação. A pedagogia tem que se inspirar cada vez mais na ciência, na ideia da procura, da pesquisa, da descoberta, tem que compreender que as aprendizagens assentam numa lógica de estudo que as tecnologias favorecem, que é importante colocar os alunos em situação de “criarem” conhecimento, não se limitando a um “consumo” passivo dos ensinamentos do professor.

No Brasil, há uma discussão no Legislativo sobre um projeto chamado “Escola sem partido”. O grupo de deputados quer proibir que haja “doutrinação ideológica” nas escolas. Os críticos afirmam que há censura. Como o senhor observa essa proposta?
É uma proposta absurda e sem sentido. Volta e meia, surgem propostas deste tipo. Felizmente, costumam desaparecer rapidamente. É estranho que surjam neste ano de 2016, quando se celebra o centenário dessa obra notável de John Dewey, “Democracia e Educação”, que há cem anos já disse tudo o que há para dizer sobre este assunto. Os professores têm a obrigação de apresentar as distintas visões do mundo às crianças, sobretudo as que assentam na ciência e na justiça. O professor não pode fazer tábua rasa das suas posições, mas deve colocá-las a serviço de uma exigência de conhecimento e de rigor. O trabalho do professor é abrir caminho para os alunos, para que eles formem a sua própria visão do mundo. A escola deve apresentar o mundo, todos os mundos, às crianças. Não deve impor uma visão, mas apresentar todas as visões. Para que a criança se faça adulta, pela razão e pela tolerância. Para que a criança possa ir escolhendo seus caminhos. Com liberdade. Quando a perdemos, perdemos a escola.
* Do "Extra"

"Ensino médio, entre o passado e o futuro"

Fonte: Folha de São Paulo
21 de setembro de 2016

Acessar em: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2016/09/1815276-ensino-medio-entre-o-passado-e-o-futuro.shtml


"Governo deve anunciar, nesta quinta, MP com reforma do ensino médio"

Fonte: O Globo
21 de setembro de 2016

Texto prevê etapa estruturada em módulos e flexibilização de disciplinas


POR 
BRASÍLIA e RIO- O governo preparou o texto de uma Medida Provisória (MP) para reformar o ensino médio, segmento que representa, hoje, um dos maiores desafios da educação nacional. A proposta, que deve ser anunciada nesta quinta, compreende, entre outras mudanças, o fatiamento dessa etapa escolar, criando um sistema modular, que permitirá ao aluno obter certificados parciais. Ao fim de cada semestre letivo, o estudante poderá trancar matrícula, com retirada do comprovante de conclusão até aquele ponto, a partir do qual poderá retomar os estudos posteriormente.
O objetivo é dinamizar essa etapa do ensino básico, marcada pelas altas taxas de evasão de alunos (há 1,7 milhão de adolescentes de 15 a 17 anos fora das salas de aula) e pelos baixos índices de rendimento escolar. A educação profissionalizante estará incluída no ensino médio como parte complementar às matérias obrigatórias.O novo sistema deve funcionar com 50% da carga curricular obrigatória e comum nacionalmente, que deve ser definida pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), atualmente em discussão, e os outros 50% incluirão disciplinas extras como um “aprofundamento da formação”.
Ficará a cargo dos sistemas estaduais, que respondem por 97% das matrículas do ensino médio público do país, definir quais disciplinas deverão ser ofertadas na metade “aberta” do currículo nas seguintes áreas: linguagem; matemática; ciências sociais e humanas; ciências da natureza e formação técnica profissionalizante.
A ideia de flexibilizar o formato do ensino — dando às redes locais independência para alinhar as expectativas do aluno com o conteúdo a ser ministrado, dentro de parâmetros gerais — está no cerne da proposta do governo. O objetivo é fazer da escola um local mais atraente, enxugando disciplinas excessivamente detalhadas e evitando repetir matérias que o estudante já domina. Assim, alunos que já têm proficiência em inglês ou informática, por exemplo, poderão ser liberados das disciplinas ou pular para turmas mais avançadas.
No campo da língua estrangeira, o idioma de matrícula obrigatória será o inglês. E cai a regra atual de ter o espanhol como segunda língua estrangeira, optativa para os alunos mas de oferta obrigatória para a rede de ensino. O texto da MP apontará apenas que se dê preferência ao espanhol como segundo idioma estrangeiro a ser ensinado.
Acúmulo de disciplinas
Um ponto em discussão é se a MP deve prever que um professor concursado em uma disciplina poderá acumular, junto com o ensino dessa matéria, outra que seja correlata e para a qual não haja docente disponível — bastando, para isso, ter “notório saber” do tema. A regra é polêmica. De um lado, pode corrigir distorções como professores lecionando disciplinas de áreas completamente diferentes daquela em que se formaram. De outro, o mecanismo legal pode acabar institucionalizando a prática de não garantir professores com formação adequada, problema grave no ensino médio, sobretudo em matérias como física, sociologia e filosofia.
A medida provisória também poderá prever a oferta de programas, como os de educação em tempo integral, que vão alterar o cálculo do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Professores da Educação (Fundeb), canal de distribuição de recursos que se baseia no número de matrículas. O governo quer apostar na ampliação da jornada escolar para tirar o ensino médio da estagnação verificada desde 2011, com o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) paralisado em 3,7 pontos, longe da meta de 4,3 pontos projetada para 2015.
Ao divulgar os números, no início deste mês, o ministro da Educação, Mendonça Filho, anunciou que solicitaria ao presidente Michel Temer a edição de uma MP para agilizar a reforma do ensino médio. Dentro do governo houve um debate em torno do formato mais adequado dessa reestruturação. O Planalto defendia que a matéria fosse apresentada ao Congresso como projeto de lei do Executivo ou que se aproveitasse uma proposta que já tramita na Câmara sobre o tema. Mas, segundo interlocutores do presidente, Mendonça Filho pressionou para que o texto elaborado por sua equipe técnica embasasse a reforma. E que isso fosse feito de forma emergencial. Por esse motivo, teria que ser via MP, que já passa a valer imediatamente após a sua publicação, embora o Congresso tenha que aprová-la para que se torne lei.
A ideia do governo é que as novas regras já passem a valer no ano que vem. O MEC também conta com a MP para elaborar a Base Nacional Comum Curricular do ensino médio.
FOCO NAS HABILIDADES
Especialistas avaliaram de maneira positiva a tentativa de reformulação e acreditam que o conjunto de medidas permite ao aluno direcionar melhor os estudos, de acordo com suas habilidades e interesses.
— O Brasil precisa parar de tentar inventar a roda. Precisa ir na direção de ter um núcleo comum e trajetórias flexíveis, tanto acadêmicas quanto profissionalizantes. Essas mudanças vão em uma boa direção. A ideia de o ensino profissionalizante ser complementar faz todo sentido dentro do que temos acumulado em relação à transformação da etapa — afirma Ricardo Henriques, superintendente executivo do Instituto Unibanco. — Aumenta a chance de engajamento e mobilização dos jovens e facilita a gestão das escolas, que poderão distribuir melhor seus professores.
Já Priscila Cruz, presidente-executiva do movimento Todos pela Educação, avalia que, ao alterar a estrutura do ensino médio de anos para módulos, é preciso ter cuidado para evitar um aumento na evasão:
— Hoje temos 13 disciplinas obrigatórias distribuídas e o resultado é que o aluno aprende quase nada sobre um monte de coisa. É importante que o aluno já comece a exercitar suas vocações no ensino médio — acredita. — Se o modelo não vier acompanhado de um sistema que estimule o aluno a ir até o final, a evasão pode aumentar. O aluno acha que vai voltar e às vezes não volta. Tem que ter mecanismos para desestimular o trancamento, e que incentivem o aluno terminar na idade certa.
Colaborou Paula Ferreira