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quinta-feira, 30 de junho de 2016

"Sem partido e sem educação? Conheça os projetos de lei que questionam a formação cidadã na sala de aula"

Fonte: educação&participação
30 de Junho de 2016

Com maior expressão a partir de 2014, quando o país construía seu Plano Nacional de Educação (PNE), projetos de lei que buscam proibir que o professor “doutrine” seus educandos começavam a ser apresentados no Poder Legislativo de municípios, estados e, inclusive, em âmbito federal. Saiba os desafios que essas iniciativas trazem para o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e jovens que, segundo a nossa Constituição, têm o direito de receber do Estado uma educação democrática voltada à cidadania
“A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”, assim descreve o artigo 205 da nossa Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de 1988.
O artigo refere-se ao projeto de educação que, por meio de uma luta histórica, a sociedade conquistou: a educação deve ser, acima de tudo, democrática e garantir um desenvolvimento integral, que promova a cidadania, a todas as brasileiras e brasileiros.
“Na história, a educação democrática no Brasil teve um grande avanço nos anos 1930, com o movimento da Escola Nova, que trouxe um embrião de uma educação mais integral com a perspectiva de uma formação cidadã. Após um retrocesso ocorrido na ditadura militar, voltamos a ter uma educação orientada para a cidadania, já com a retomada da democracia e a nova Constituição. Essa educação é uma aspiração de toda a sociedade, ela não está ligada a um partido, ela se relaciona a uma concepção de um sujeito inserido em uma sociedade com todos os desafios da contemporaneidade e legitimada por diversos marcos regulatórios”, explica Anna Helena Altenfelder, superintendente do Cenpec.
educação integral busca garantir o pleno desenvolvimento de crianças, adolescentes e jovens – e de acordo com a Temática Currículo e educação integral, recentemente publicada pela plataforma Educação&Participação, essa opção reconhece crianças, adolescentes e jovens como sujeitos de direitos: é uma opção pela cidadania.
O sujeito precisa ser respeitado e considerado em sua integralidade, inserido na sociedade sob uma perspectiva cidadã e autônoma, de exercício de plenos direitos – civis, políticos e sociais.
Essa perspectiva, por sua vez, responde a um longo processo de evolução que remete a um projeto de educação com respaldo nas leis brasileiras: a Constituição de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), o mais recente Plano Nacional de Educação (PNE) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Contudo, iniciativas vêm colocando em xeque o entendimento do que vem a ser uma educação democrática nas escolas, pautada pela cidadania e pela garantia da pluralidade de opiniões.

“Esse movimento coloca em risco o processo democrático que a educação vive hoje e também a formação desse sujeito crítico, que é ser cidadão para poder atuar na sociedade, ter uma leitura crítica da realidade, entender que em uma sociedade democrática coexistem, convivem pensamentos diferentes, posições diferentes e que é do debate dessa pluralidade de opiniões que surgem soluções, políticas e propostas interessantes” (Anna Helena Altenfelder, superintendente do Cenpec)


Quase 28 anos após a promulgação da Constituição, em uma terça-feira, 26 de abril de 2016, por 18 votos a 8, os deputados da Assembleia Legislativa de Alagoas decidem derrubar o veto do governador Renan Filho (PMDB) ao Projeto Escola Livre. Com a decisão, Alagoas se torna o primeiro estado brasileiro a ter uma lei – a de nº 7.800/2016 – que exige neutralidade do professor em sala de aula, ou, como dizem seus defensores, proíbe a prática de “doutrinação política e ideológica” (artigo 2º) dos educandos por parte dos docentes e da administração escolar.
A iniciativa não é isolada. Levantamento realizado pela plataforma Educação&Participação, atualizado até 10 de junho de 2016, mostra que na esfera federal e em nada menos que 19 estados, há projetos de lei semelhantes em nível estadual e/ou municipal, que levantam questões importantes sobre a prática docente; a liberdade de expressão e de cátedra; os direitos constitucionais de pais, educadores e educandos; e a educação integral e sua proposta de formar sujeitos de direitos.
“Esse movimento coloca em risco o processo democrático que a educação vive hoje e também a formação desse sujeito crítico, que é ser cidadão para poder atuar na sociedade, ter uma leitura crítica da realidade, entender que em uma sociedade democrática coexistem, convivem pensamentos diferentes, posições diferentes e que é do debate dessa pluralidade de opiniões que surgem soluções, políticas e propostas interessantes. Essa flexibilidade de pensamento, de poder ouvir distintas perspectivas, que no mundo atual é tão necessária, está seriamente comprometida com essas iniciativas”, argumenta a superintendente.
Liberdade versus doutrinação
Para entender melhor quais consequências essas ações trazem para um projeto democrático de educação, a plataforma Educação&Participação investigou cada elemento defendido pela Lei Escola Livre. Tanto na lei alagoana como nas propostas de outros estados e municípios, existe um conjunto de pontos em comum:
(a) A defesa da neutralidade política, ideológica e religiosa do Estado, do pluralismo de ideias e da liberdade de crença e consciência por parte dos educandos;
(b) Baseando-se sobretudo no parágrafo 4º do artigo 12 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), a defesa do direito dos pais ou tutores de que seus filhos ou pupilos recebam a educação religiosa e moral de acordo com suas próprias convicções;
(c) O reconhecimento dos educandos como a “parte mais fraca” na relação de aprendizado, de maneira que se veta ao professor, entre outras coisas, a prática de doutrinação política e ideológica dos estudantes, sua cooptação a qualquer corrente específica de religião, de ideologia ou político-partidária e a propaganda dessas correntes de pensamento em sala de aula, inclusive sem estimular a participação dos estudantes em passeatas ou outros atos públicos. Mais ainda, exige-se do professor que, ao tratar de questões políticas, socioculturais e econômicas, as principais versões, teorias e opiniões das diferentes correntes sejam apresentadas “de forma justa” aos educandos.
São coincidências que não ocorrem à toa. Propostos por parlamentares e até prefeitos das mais variadas siglas – PMDB, DEM, PEN, PDT, PTN, PSD, PP, PSC, PV, PSDB etc. –, os projetos, via de regra, se inspiram ou são apoiados no movimento Escola sem Partido, que não por acaso dá nome à maioria deles.
“O movimento começou em 2004 e surgiu como reação a duas práticas ilegais, inconstitucionais, que se disseminaram por todo o sistema educacional: de um lado, a instrumentalização do ensino para fins político-ideológicos, o que chamamos de doutrinação político-ideológica em sala de aula e nos livros didáticos; de outro lado, a usurpação do direito dos pais sobre a educação religiosa e moral dos seus filhos, que também está previsto em lei”, diz o advogado Miguel Francisco Urbano Nagib, criador do Escola sem Partido.
>> Ouça, na entrevista abaixo com Nagib e com Bráulio Tarcísio Pôrto de Matos, doutor em Sociologia e professor da Universidade de Brasília (UnB), os argumentos defendidos pelo movimento.

Nas palavras dos idealizadores, as propostas do Escola sem Partido ecoam direitos constitucionais sedimentados para estudantes e seus pais, mas a polêmica em torno de projetos de lei com essas propostas facilmente evidencia:
(a) A definição apresentada de doutrinação político-ideológica é suficiente? Quem definirá o que é ou não doutrinação?
(b) A liberdade de cátedra, ou liberdade de ensinar, realmente se difere da liberdade de expressão?
(c) É realmente dever do Estado fornecer uma educação condizente com os valores religiosos e morais de cada pai?
(d) O professor realmente pode ser neutro? Ele não poderá ser processado por qualquer coisa que diga em sala de aula, bastando que pais ou alunos discordem?
(e) A proposta não tira dos alunos o acesso a determinadas informações e posicionamentos a que teriam direito no âmbito escolar?

Confira, no infográfico, o status dos projetos de lei inspirados no movimento Escola sem Partido em todo o País.
O Estado do Paraná é o que mais propostas registrou: uma em nível estadual, arquivada a pedido dos próprios proponentes, uma aprovada em nível municipal e outras em trâmite. Dos municípios que registram projetos de lei em discussão, seis são capitais: Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Palmas e Teresina.

Constituição e ideologia
Opositor da Lei Escola Livre, o defensor público do Estado de Alagoas e professor de Direito Constitucional Othoniel Pinheiro Neto destacou exatamente o que considera fragilidades em projetos com essas propostas no encontro “Escola democrática versus ‘Escola sem partido’”, promovido pela Associação Nacional de História (ANPUH) e pela Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), realizado no último dia 24 de junho.
Segundo Pinheiro Neto, propostas estaduais como a aprovada em Alagoas, que não foi discutida com a sociedade civil, a Secretaria de Educação e demais setores públicos, possuem vício de iniciativa ao partir da autoria de parlamentares. Isso porque projetos de lei com ingerência sobre atividades e serviços exercidos diretamente por órgãos ligados ao Poder Executivo, como as secretarias de Educação, que gerenciam as escolas públicas, somente podem ser propostos por iniciativa do próprio Executivo.
Além disso, extrapolam a competência de estados e municípios, que podem apenas legislar, no que tange à educação, sobre peculiaridades locais: a competência para propostas diretivas cabe à União (poder público federal).
Para o professor de Direito Constitucional, também faltam estudo e base técnica para fundamentar esses projetos, que ainda empregam termos vagos, pouco claros e muito abertos, carecendo portanto de razoabilidade – o que lhes confere inconstitucionalidade material. “O que é ‘neutralidade’, ‘prática de doutrinação’, ‘poder estar em conflito’, ‘de forma justa’?”, questionou ele no evento da PUC-SP. Para Pinheiro Neto, isso permite que o professor possa ser “processado por qualquer coisa que diga em sala de aula”.

“Meus professores têm medo de dar a opinião deles, principalmente minha professora de Sociologia. Imagine com o Projeto Escola sem Partido?” (Manuela Day, 15 anos, estudante)


Um dos aspectos que especialistas questionam é o próprio entendimento de bases legais utilizadas pelo movimento e pelos projetos de lei, como o Pacto de San José da Costa Rica, que, de acordo com Pinheiro Neto, tem erros de interpretação.
Segundo ele, o Pacto de San José evoca direitos fundamentais de primeira geração, que são direitos individuais de caráter negativo, que exigem uma abstenção do Estado. Portanto, o artigo 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos não pode ser estendido ao entendimento da oferta da educação pelo Estado à população: trata-se, na verdade, da garantia ao pai ou tutor de buscar receber uma educação para seu filho ou pupilo condizente com seus valores, sem que o Estado tenha poder de obrigá-lo a agir de modo diverso.
A oferta da educação pública pelo Estado, continuou Pinheiro Neto, é um direito fundamental de segunda geração, aqueles que, aí sim, exigem a atuação do Estado. O especialista ratifica sua posição no artigo 13 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que traz os deveres do Estado e ecoa a proposta de San José como respeito à liberdade dos pais na escolha de qual educação prover aos filhos, e não como exigência da oferta de um determinado tipo de educação, submetido ao posicionamento dos pais, por parte do Estado.
Saiba mais
> Othoniel Pinheiro Neto é autor de um artigo sobre as inconstitucionalidades dos projetos de lei Escola sem Partido. Leia aqui.
> Saiba mais sobre as diferentes gerações, ou dimensões, dos direitos fundamentais neste artigo.
> Confira nossa reportagem sobre a importância da participação social, do debate público e da gestão democrática na educação integral.

Uma neutralidade possível?
Se, no âmbito técnico e jurídico, os projetos de lei inspirados nas propostas defendidas pelo movimento Escola sem Partido e similares excitam polêmicas, não é diferente no âmbito pedagógico e educativo. Uma das questões mais controversas é exatamente a exigência de neutralidade do professor, ou pelo menos o veto à “propaganda de correntes de pensamento”.
Para a superintendente do Cenpec, imaginar um ensino no qual não se tenha um posicionamento é um contrassenso. “O professor, ao exercer sua atividade, transparece sua visão de mundo. Seria artificial imaginar essa neutralidade na educação, já que ela não existe. Como estamos vivendo em um contexto democrático garantido por nossa legislação, é importante que se tenha na sala de aula um ambiente plural, que promova a análise crítica, o questionamento, um ambiente onde existam diferentes opiniões. O professor tem que trazer a sua visão, mesmo que diferente, e provocar o debate, mostrando as diversas visões, os diferentes pontos de vista e ao mesmo tempo trazer para a discussão o ponto de vista das famílias, de outro professor, outros pontos de vista que circulam. Isso é possível”, explica. 
O advogado Camilo Onoda Luiz Caldas, doutor em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São Paulo (USP), também questiona a neutralidade defendida pelo movimento Escola sem Partido e similares. Para Caldas, esses movimentos atendem, na verdade, a posições e ideologias conservadoras, além de que a legislação atual já possui dispositivos que protegem os alunos contra eventuais perseguições e excessos promovidos por professores. Assista à entrevista em vídeo.

De acordo com o psicólogo e analista do comportamento João Batista Pedrosa, é de fato importante que o professor atue no sentido de expor o educando a diferentes concepções acerca de assuntos controversos – mas isso não significa exigir dele neutralidade, o que é inclusive impossível do ponto de vista psicológico. Ouça o áudio:

“A educação que a pessoa recebe em casa é só parte da dimensão total do que é a educação. Na escola, os sujeitos vão aprender a conviver juntos, fora do ambiente familiar, tanto é que o professor também tem um papel de educador” (Gustavo Henrique Bellatore, professor)


Para Paulo Cesar Rodrigues Carrano, doutor em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e primeiro-secretário da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), os projetos de lei expõem uma “encruzilhada civilizatória”.
Fazendo referência ao sociólogo Émile Durkheim, Carrano, que também participou do evento na PUC-SP, argumentou que uma sociedade democrática requer ouvir o outro e fazer uma opção por conviver e coexistir, o que só é possível dentro de uma moral laica. Não faz sentido, portanto, exigir que a escola ofereça aos estudantes apenas aquilo que os valores religiosos e morais de seus pais permitam.
Para o representante da Anped, também não é correto opor liberdade de ensinar (liberdade de cátedra, prevista no artigo 206 da Constituição) e liberdade de expressão (expressa noartigo 5º), uma vez que, se a primeira se refere ao exercício profissional, a última se estende a todos os cidadãos. “Se o professor é cidadão, então ele também tem direito à liberdade de expressão”, disse o especialista no encontro da PUC-SP.
Carrano lembrou ainda que os filhos não são “coisas”, mas sujeitos autônomos que precisam ter sua autonomia respeitada no âmbito escolar. É uma posição que condiz com a defendida pelo professor de Filosofia e Sociologia Gustavo Henrique Bellatore, que atua em escolas de ensino público e privado e comenta sobre o projeto de lei no Estado de São Paulo: “O projeto de lei teme perder o poder de educação individualista […] que vê os filhos como propriedade, não dentro de um contexto coletivo, integrado e diverso”.
Para o professor, a escola é um espaço de convivência e de debate, que é, inclusive, trazido pelos próprios educandos. “O que eu mais vejo é a politização dos alunos […]. As contradições estão mais latentes, mais evidentes, e os alunos trazem esses debates para as salas de aula […]. Nessa situação, o professor, mesmo que não queira, tem que tratar desses temas – as diferenças entre as polarizações, as questões políticas, corrupção, maioridade penal, impeachment… Eles [alunos] apresentam e você precisa trabalhar. Na minha opinião, a escola é onde você deve debater esses temas, as nuances da sociedade, as transformações pelas quais passa.”
Gustavo Bellatore também argumenta que a proposta prejudica a formação dos educandos: “O projeto Escola Sem Partido coloca a ideia de que o próprio aluno deve se posicionar sem ao menos ter direito à informação. Isso é um absurdo. Além de que não existe isso de transmissão, doutrinamento ideológico: ideologias não são casacos que você pendura em cabides. Quando você organiza um debate, você chama os alunos para uma troca, para levarem as visões sobre o seu dia a dia, sua realidade… Debates políticos e sobre diferentes posicionamentos acontecem todos os dias, em qualquer lugar: em reunião de condomínio, na fila de banco… e também na escola. As crianças vivem fortes contradições sociais e econômicas, existe muita exigência de mudança. Vemos isso no movimento de ocupação das escolas, nos movimentos estudantis secundaristas. Tenho utilizado muito debate, leitura de jornais… Trazemos informações e debatemos”.
Participante de um desses movimentos de ocupação e estudante da Escola Estadual Godofredo Furtado, na zona oeste de São Paulo (SP), a jovem Manuela Romero Day ecoa a visão do professor: “Com o Projeto Escola sem Partido, o professor não vai poder dar sua própria opinião, o que vai deixar o aluno mais ignorante do que ele já é. A escola, querendo ou não, já tem esse negócio rigoroso, de o aluno não poder exercer sua liberdade. Com o projeto, isso ficaria mais à vista: os alunos não poderiam debater, e isso não vai ajudar na formação deles, não vai ajudar no futuro deles”.
A voz de professores e diretores
“Na minha opinião, o professor deve ter a liberdade de falar e ensinar em sala de aula”, diz Erivelton Rangel de Almeida, presidente da organização da sociedade civil (OSC) Bem Faz Bem, de Campos dos Goytacazes (RJ). Além de atuar na OSC, Almeida também é professor.
Assista ao vídeo abaixo, que traz a opinião do diretor de escola Claudio José da Silva:

Escola + família para o desenvolvimento integral
Para garantir o desenvolvimento integral, assim como prevê a Constituição Federal, a escola também precisa envolver a família. O movimento Escola sem Partido também cita o envolvimento da família na educação de crianças, adolescentes e jovens, porém, coloca-as em situações contrapostas.
“É preciso envolver a família no processo de construção do projeto pedagógico das escolas, da discussão sobre o que os seus filhos devem aprender, do que devem saber. Nesse sentido, há todo um avanço na construção de uma escola plural, laica, republicana e pública que vê a participação da família e da sociedade como fator essencial no desenvolvimento de crianças, adolescentes e jovens. Eu vejo com muita preocupação esse movimento da Escola sem Partido porque ele vai na contramão disso. Ele fomenta um antagonismo entre escola e família, em um ambiente de embate e isso traz um atraso e um comprometimento não só da educação democrática, mas também compromete o processo de aprendizagem dos alunos como um todo”, explica Altenfelder.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

"Merenda é assunto sério."

Leia Mais:http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,merenda-e-assunto-serio,10000059802
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FontSiga @Estadao no TwitterLeia Mais:http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,merenda-e-assunto-serio,10000059802Fonte: Estadão Opinião
29 de Junho de 2016

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Brasil descumpre metas parciais do Plano Nacional de Educação.

Fonte: Folha de São Paulo
29 de junho de 2016


Acessar em: http://www1.folha.uol.com.br/educacao/2016/06/1786711-brasil-descumpre-metas-parciais-do-plano-nacional-de-educacao.shtml


"País não cumpre metas do Plano Nacional da Educaçao para 2016."

Fonte: Globo Educação
29 de Junho de 2016


Relatório mostra que de 21 objetivos traçados pela lei em 2014, apenas um foi cumprido



Metas como ter todas as crianças de 4 a 5 anos do país em salas de aula deveria ter sido cumprida até este mês, mas há 640 mil crianças nessa faixa etária fora da escola - Divulgação/ Hélio Melo



RIO - Dois anos após o Plano Nacional de Educação (PNE) entrar em vigor, em junho de 2014, o acompanhamento das metas estabelecidas frustra educadores, que contavam com a força da lei para ver melhorias no ensino do país. Considerado a espinha dorsal para o desenvolvimento educacional no Brasil, o PNE trouxe 20 metas — com uma série de objetivos — a serem atingidas ao longo de dez anos. Mas especialistas e autoridades já perderam as esperanças de ver alcançados os objetivos traçados para 2016, como a universalização das matrículas para crianças de 4 e 5 anos.


A Campanha Nacional Pelo Direito à Educação (CNDE) elaborou um relatório para alertar sobre o descumprimento de todos os mais importantes dispositivos previstos para 2016. Já o movimento Todos Pela Educação (TPE) divulgou, nesta terça-feira, um estudo no qual conclui que, dos 21 objetivos, entre metas, artigos e estratégias a serem alcançados até junho deste ano, apenas um foi cumprido: a implementação de um fórum permanente de acompanhamento do valor do piso salarial dos professores. Para outros cinco não há dados atualizados, mas o monitoramento feito por especialistas já indica que não foram — e nem serão — alcançados este ano. A respeito dos 15 objetivos restantes, há informações de que também não foram cumpridos.


Entre as 20 grandes metas do PNE, sete deveriam ter sido alcançadas dois anos após a criação do plano. Segundo o TPE, seis delas não foram atingidas. A lei determinava, por exemplo, que todas as crianças de 4 a 5 anos do país estivessem em salas de aula até este mês. No entanto, há 640 mil crianças, ou 10,9% da população nessa faixa etária, fora da escola. Os dados mais atualizados são referentes a 2014, mas o monitoramento dos indicadores feito por diferentes ONGs e pelo próprio Ministério da Educação (MEC) informa que a meta não será atingida.
A universalização do ensino para adolescentes de 15 a 17 anos também ficou no papel. Os dados mais atuais dão conta de que há ainda 1,7 milhão de pessoas na faixa etária sem atendimento escolar. Militantes da causa acreditam que a crise econômica que o país atravessa, com cortes em áreas como construção de creches e formação de professores, tem sido o maior obstáculo para a concretização desses objetivos.
— Sem novos recursos, há quem diga que pode aumentar o número de crianças fora da escola. É vergonhoso o Brasil não conseguir universalizar a pré-escola e a alfabetização — afirma o coordenador da CNDE, Daniel Cara, um dos principais articuladores do PNE na sociedade civil. — O governo federal não pode considerar o PNE um fardo, desde 2014 muito mais deveria ter sido feito.
De acordo com a presidente-executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz, essas notícias negativas não podem desanimar as autoridades envolvidas no cumprimento das metas.
— Enquanto não houver um trabalho estruturante, corremos o risco de ter, ano após ano, as metas não cumpridas. O plano é ambicioso, mas grande parte dele é realizável, não podemos desmobilizar. As 15 primeiras metas têm responsabilidade de estados e municípios e só vamos conseguir alcançá-las com um trabalho bem gerido.

MENOS REPASSE DE RECURSOS
Embora a responsabilidade pela meta da educação infantil seja das cidades, os repasses de recursos vindos da União são importantes para a expansão de matrículas, bem como para o alcance de outras metas ligadas à educação básica. Dados do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), responsável pelo Proinfância, voltado para a infraestrutura de creches, mostram que o valor destinado ao programa caiu de R$ 2,6 bilhões em 2014 para R$ 403 milhões em 2015.
— Expansão tem custo. Se os municípios, que já têm problemas econômicos, não recebem recursos, a situação fica pior. Como expandir matrícula num cenário no qual não se consegue nem manter o que existe? — questiona o presidente da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Alessio Costa Lima.
A meta 15 do PNE, que determina a implementação de política de formação para professores da educação básica, ainda não foi concluída. Dados do último Censo Escolar da Educação Básica, divulgados em março, revelam um panorama preocupante: 39% dos docentes não têm formação adequada na disciplina que lecionam.
A dificuldade em promover o acesso total ao sistema educacional e ampliar a qualificação dos docentes tem em seu cerne a falta de um financiamento maior para área. Para especialistas, a questão econômica está ligada à não implementação do Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi), que estabelece um valor de investimento mínimo por aluno e deveria ter entrado em vigor neste ano. A criação do CAQi representaria uma demanda de R$ 40 bilhões a mais, por ano, em educação básica. E segundo a CNDE, sem sua implementação e com cortes no orçamento, todas as demais metas e estratégias do PNE ficam inviabilizadas.
Em resposta ao GLOBO, o MEC afirma que está “realizando uma análise cuidadosa do orçamento para implantação do CAQi” e argumenta que atual gestão recebeu o orçamento com corte de R$ 6,4 bilhões. Em relação à universalização da educação infantil, o MEC diz que focará na melhoria e ampliação da aplicação dos recursos para ofertar creches e promover acesso à pré-escola. Sobre o ensino médio, o órgão afirma que terá como prioridade a reforma desta etapa. Já para alcançar a meta relacionada à alfabetização, o MEC diz que está elaborando estudos para redesenho do Programa Brasil Alfabetizado, com foco no acesso à Educação Profissional e Tecnológica. A pasta divulgará nos próximos dias os indicadores de monitoramento das metas e o relatório técnico de avaliação do PNE.

"Educação de má qualidade mata lentamente"

Fonte: Uol Educação
29 de Junho de 2016

Quem tem filhos, sobrinhos ou crianças próximas já se pegou dizendo: onde você aprendeu isso? Essa perplexidade é tão comum porque realmente é surpreendente para nós, adultos, a capacidade de aprendizagem das crianças. Pode ser uma música em inglês cantarolada pela casa, a afirmação de que os seres vivos vieram do pó das estrelas, uma palavra não muito coloquial (a minha filha mais velha sempre usa "entretanto", em vez do simples "mas"). Quando começam a ir para a escola, a dormir na casa dos amigos, a circular pelo mundo sem a nossa presença, as surpresas aumentam ainda mais. A cada dia surge um monte de aprendizados, perguntas e coisas novas.
Aprender é natural. Nem se quiséssemos poderíamos evitar. É como respirar.
Até dentro da barriga da mãe o bebê já está aprendendo. Toda criança aprende, pode aprender, vai aprender.
Então, por que convivemos com tanta naturalidade com o fato de algumas crianças aprenderem e outras não? Por que nos indignamos tão pouco com o fato de apenas metade das crianças estarem alfabetizadas aos 8 anos de idade? Por que aceitamos tão facilmente que as crianças mais pobres são aquelas que recebem as piores condições para aprender?
Por que não exigimos diariamente que todas as crianças tenham o aprendizado a que elas têm direito?
Mais ainda, por que insistimos em um modelo de ensino que, quando massificado, não funciona, não garante que todos aprendam?
Esse é um campo de estudo e análise para especialistas de várias áreas, de sociólogos a educadores, de cientistas políticos a antropólogos. Mas arrisco aqui algumas ideias a partir do que vivi nesses últimos dez anos no Todos Pela Educação.
  • 1. Educação de má qualidade mata lentamente
Um dia ruim não mata ninguém. Mas meses e anos sem ter acesso à educação de qualidade diminuem as chances de uma criança colocar seu potencial em prática, ter e realizar seu projeto de vida.
  • 2. Educação sempre fica para amanhã
Porque educação é um processo que acontece diariamente, manter o compromisso com ela exige um esforço diário – não pode haver tréguas. Mas como os resultados só são visíveis tempos depois que o esforço foi feito, outras exigências do dia a dia de recompensa mais imediata acabam atropelando a educação. Quem nunca pensou: é só um dia de aula, que mal fará eu ficar em casa hoje? Esse mesmo raciocínio contamina a política pública e as escolhas do país. Se o que um gestor público fizer hoje não resultar em mais votos amanhã, os incentivos para ele direcionar mais esforços nesse sentido diminuem.
  • 3. Educação de qualidade em larga escala é difícil
Ok, e aqueles gestores que, mesmo sabendo que a educação não trará benefícios imediatos para eles, ainda assim acreditam que precisam torná-la o centro de seu projeto? Pois bem, se isso fosse fácil, já teria sido feito. Melhorar a educação não é tarefa de uma gestão, mas de várias seguidas, articuladas, em um processo persistente e corajoso. Então, entra governo, sai governo, o esforço não produz os resultados esperados, e infelizmente acabamos nos acostumando com isso. 
  • 4. Educação de qualidade é de difícil percepção
A importância da educação parece já estar na boca de todos, mas de que educação estamos falando? Será que é apenas a valorização da vaga ou da merenda? Ter a vaga é imprescindível, a merenda pode ser a principal refeição que a criança ou o jovem fará no dia, mas eles têm direito a muito mais – têm direito a aprendizagem todos os dias.
  • 5. Educação boa mesmo, a gente aceita que é para poucos, como outros direitos
Em um país desde sempre tão desigual, nos acostumamos a situações absurdas em várias áreas, desde cadeias superlotadas, com condições sub-humanas, até a falta de transporte público decente na periferia. Não é diferente com a educação. Infelizmente, acabamos nos anestesiando, e falta nos indignarmos com a diferença de condições básicas justamente para as crianças mais pobres. Em que escolas mais faltam professores experientes? Saneamento básico? Internet banda larga? Naquelas que mais precisam.
Fica aqui esse meu desabafo. Até quando vamos tolerar que a Educação não seja de fato uma prioridade nacional?

PRISCILA CRUZ

Priscila Cruz é fundadora e presidente-executiva do movimento Todos Pela Educação. Graduada em Administração (FGV) e Direito (USP), mestre em Administração Pública (Harvard Kennedy School), foi coordenadora do ano do voluntariado no Brasil e do Instituto Faça Parte, que ajudou a fundar.

terça-feira, 28 de junho de 2016

" A prova da merenda.

Fonte: Folha de São Paulo Opinião
28 de Junho de 2016

Está marcada para esta terça-feira (28), na Assembleia Legislativa de São Paulo, a segunda sessão da CPI da merenda. Em tese, a comissão parlamentar deveria fortalecer as investigações do escândalo na alimentação escolar, conduzidas desde janeiro pelo Ministério Público e pela Polícia Civil.
Têm-se esquadrinhado contratos celebrados entre a Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf) e dezenas de prefeituras, além da Secretaria Estadual da Educação.
Suspeita-se de um esquema de superfaturamento na distribuição de suco de laranja para a rede pública, com propinas que atingiriam até 30% dos valores contratados.
Por meio de delações premiadas, alguns investigados implicaram membros do governo Geraldo Alckmin (PSDB), além de deputados federais e estaduais. Entre eles, Fernando Capez (PSDB), presidente da Assembleia.
Apesar disso —ou por causa disso—, são diversos os sinais de que a investigação parlamentar caminha para não cumprir seu papel.
Não só 8 de seus 9 integrantes são de partidos da base de apoio de Alckmin, como o presidente e o vice da comissão pertencem ao PSDB e ao PSB (partido do vice-governador), respectivamente. Tal domínio alimenta temores de que a apuração se concentrará em prefeituras do PT, desviando o foco do governo estadual e de Capez.
Como se não bastasse, um dos titulares da comissão, Barros Munhoz (PSDB), notabilizou-se há alguns anos por afirmar: "CPI, no Brasil, só vocês da imprensa acreditam, mais ninguém. (...) É conversa mole, coisa para enganar".
A frase infame tem sido confirmada nos âmbitos federal, estadual e municipal. Há tempos os políticos aprenderam a domesticar CPIs —quando não utilizá-las para extorsões e propinas—, tornando ultrapassada a máxima de que se sabe como tais comissões começam, mas não como terminam.
No Estado de São Paulo, nos últimos anos, a ampla base de apoio dos governos do PSDB tem agido para impedir que a Assembleia apure escândalos envolvendo políticos do partido. As poucas investigações que conseguem superar essa barreira terminam desidratadas e sem resultados.
No escândalo da merenda, o governo do Estado se considera vítima, segundo declarou Alckmin. Tanto o governador como seus aliados deveriam, portanto, ser os maiores interessados em esclarecer o episódio, não importa a coloração partidária dos envolvidos.
Se a alegação fosse sincera, caberia dar força à CPI na condição de instrumento para elucidar os fatos.

"Quando a cultura jovem entra na escola"

Fonte: Uol Educação
28 de Junho de 2016

Maria Alice Setubal


A ocupação das escolas, ocorrida em 2015 e 2016 em diversos estados brasileiros, revelou a importância de se ouvir os jovens na construção de um novo diálogo, que leve em conta suas demandas, vivências e valores. Nas ocupações, também ficou claro que a cultura é uma dimensão fundamental para a construção das diferentes identidades e sentimento de pertencimento das juventudes na sociedade contemporânea.
Para os jovens das periferias, a cultura do hip hop – e especialmente o grupo Racionais MC"s –  deu voz aos seus espaços e modos de vida. Por meio da cultura, os estudantes viram a possibilidade de reconhecimento e de serem sujeitos protagonistas da suas histórias. Assim, eles se afirmaram e se expressaram por meio de raps, das diferentes coreografias, dos grafites, do funk e dos saraus de literatura. Ser periférico deixou de ter um caráter negativo e tornou-se, com o apoio dos grupos de cultura, uma forma de resistência à exclusão e segregação normalmente impostas a eles. Neste contexto, o território adquire uma importância fundamental na representação dessas juventudes, que denunciam os preconceitos intensos que a periferia sofre.
Voltar o olhar para as periferias é descobrir a potência, a criatividade e a mobilização existentes nesses espaços. Coletivos culturais, teatros de rua, grupos de música, campeonatos esportivos e saraus são alguns exemplos da energia irradiadora de projetos e ações ali produzidos.
É nesse contexto que as escolas de todos os territórios devem ser capazes de ouvir, acolher e debater todas essas questões dentro das salas de aula. Os jovens no Brasil e em todo mundo têm se rebelado de diferentes maneiras para serem ouvidos, serem levados em conta, serem protagonistas, autores. Muitas vezes a internet funciona como um instrumento valioso para a expressão de opiniões, de manifestações artísticas e de articulação entre diferentes grupos. Mas cabe à escola fazer uma conexão entre os saberes escolares com os temas contemporâneos.
É preciso ouvir os jovens e, ao mesmo tempo, ampliar o seu repertório de conhecimento para que essa participação política e cultural seja mais qualificada. A palavra é um objeto essencial nas escolas, não apenas na forma da escrita, mas na expressão de múltiplas falas. São vários os professores que se arriscam em projetos que buscam esse diálogo. Exemplos são iniciativas que fazem o uso de novas ferramentas digitais, como aplicativos, para que os jovens possam acessar informações, participar das questões da cidade ou do país. Blogs de literatura também fazem parte dessa autoria jovem que quer se expressar e compartilhar seus escritos.
A violência nos territórios tem ocupado um espaço cada vez maior, e muitas vezes acaba deixando a escola imobilizada e enfraquecida. Uma forma de enfrentar esse problema e buscar saídas com a comunidade é trazer a cultura e as questões intrínsecas a ela para dentro da escola. Quando passamos a ouvir as identidades, as questões sobre gênero, preconceitos, raça e orientação sexual, aproximamos as famílias da escola e criamos novos laços e um sentimento de pertencimento. Trabalhar a diversidade cultural é buscar dialogar com o mundo de hoje e construir pontes entre os diferentes.
As secretarias de educação precisam olhar para esses pontos, que já brilham em algumas escolas, e buscar desenhar políticas que deem condições para que todas as instituições de ensino possam atuar de forma mais conectada com o mundo jovem e com as demandas do século 21. Para isso, é essencial que se dê prioridade à formação de professores – tanto na capacitação inicial como na formação continuada, nas universidades e em serviço, dentro das escolas.
Os professores e educadores precisam estar capacitados para colocar esses temas em debate e fazer as possíveis articulações com os demais saberes. Não podemos exigir que as escolas assumam exclusivamente responsabilidades sobre questões que a própria sociedade não consegue resolver, como a violência. Mas podemos demandar que elas se abram e debatam esses temas de forma clara, envolvendo diferentes perspectivas. A escola continua sendo a referência mais importante nas comunidades, tanto para as crianças e jovens como para os pais. É preciso então que ela tenha as condições para assumir este papel.

MARIA ALICE SETUBAL

Maria Alice Setubal, a Neca Setubal, é socióloga e educadora. Doutora em psicologia da educação, preside os conselhos do Cenpec e da Fundação Tide Setubal e pesquisa educação, desigualdades e territórios vulneráveis.