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terça-feira, 6 de janeiro de 2015

O imperativo da qualidade de ensino

06 de janeiro de 2015
Em dez anos, metade das escolas públicas do país vai oferecer Ensino Integral. Mas, aumentar a carga horária não basta

Fonte: Gazeta do Povo (PR)

Uma das metas do Plano Nacional da Educação (PNE), a implementação do ensino em tempo integral deve ser um caminho sem volta no Brasil. A perspectiva é de que, em dez anos, 50% das escolas públicas e 25% dos estudantes tenham acesso a pelo menos sete horas de aprendizagem por dia. O simples aumento da carga horária, entretanto, não é a receita para a melhora do desempenho dos alunos e do sistema educacional do país, mas um dos ingredientes. Quantidade não garante qualidade, dizem especialistas.
Logo após a sanção da presidente Dilma Rousseff ao plano ser publicada no Diário Oficial da União, a educadora Guiomar Namo de Mello alertou para o risco de apenas aumentar o tempo. “Se a escola é ruim em um período, em dois ela é pior.”
As experiências de colégios que já oferecem ensino integral apontam que o aumento do tempo só poderá melhorar a aprendizagem se for relacionado com uma mudança no espaço e no conteúdo. Ou seja, para vencer a guerra contra os baixos desempenhos educacionais – entre os 65 países comparados no último Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), de 2012, o Brasil ficou em 58.º lugar em Matemática –, as escolas brasileiras precisam entrar no campo de batalha com três armas: tempo, espaço e conteúdo.
Percursos
“Quando se aborda a questão da educação integral, não se fala somente de ampliação da jornada na escola, mas também de uma concepção de educação mais ampla”, informa o estudo Percursos da educação integral: em busca de qualidade e equidade, publicado pela Fundação Itaú Social e pela Unicef.
Aluno integral
O Brasil agora tem o desafio de trabalhar pela qualidade dessas horas extras. Com base em experiências existentes no país, a pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Ana Maria Cavaliere identifica dois caminhos a serem trilhados pela educação brasileira: a escola de tempo integral e o aluno de tempo integral.
O primeiro modelo é focado no fortalecimento da instituição, com mudanças na estrutura, aquisição de equipamentos e aposta em profissionais com formação diversificada.
Segundo modelo tem ênfase na oferta de atividades aos alunos no turno alternativo ao do currículo tradicional, a partir da relação com instituições de diferentes setores, utilizando espaços e agentes fora do ambiente escolar.
Essa alternativa, que foca o entorno da escola, abre espaço para que as parcerias com ONGs se tornem mais comuns no país, assim como ocorre nos Estados Unidos.
Avanço começa na vizinhança
Com educação integral desde 2009, a Escola Municipal de Ensino Fundamental José Bonifácio, em Novo Hamburgo, Região Metropolitana de Porto Alegre, investe na parceria com outras instituições para oferecer atividades no contraturno. Localizada no bairro Primavera, periferia da cidade, a escola atende 370 alunos até o 5.º ano do ensino fundamental. Quase metade dos estudantes integra o programa Mais Educação, do governo federal, com seis horas e meia de aprendizagem diárias. Frente a limitações de espaço, o colégio tem parcerias com uma paróquia, com o Sindicato dos Comerciários, com uma escola de samba, e com uma escola técnica.
Segundo a diretora Cristina Dorneles, para a escola, contar com parcerias com ONGs foi o caminho para vencer a falta de espaço na hora de oferecer o ensino integral. “Só temos uma quadra de esportes”, relata a diretora.

>>Variações
Parceria com ONG é opção de contraturno nos Estados Unidos
Diretora executiva da ONG Every Hour Counts (Cada Hora Conta, em português), com sede em Nova York, Jessica Donner, explica que, nos Estados Unidos – onde os alunos passam cerca de sete horas na escola –, a maioria dos colégios mantém parcerias com ONGs para trabalhos após o período escolar, chamados de programas after school.
Assim, os estudantes recebem até três horas a mais de aprendizagem por dia, somando dez no total.
O saldo é 150% superior à carga horária da maioria das escolas brasileiras, onde os alunos passam quatro horas por dia.
A organização dirigida por Donner coordena programas after school oferecidos para alunos de baixa renda nos EUA, dando suporte na arrecadação de verba, no desenvolvimento das atividades e na avaliação dos projetos. Na prática, funciona como uma ONG que coordena várias ONGs.
No Brasil
A sugestão para o Brasil é que o país invista nas parcerias com ONGs para viabilizar o ensino integral, melhorando dessa forma o número de instituições com oferta.
Além de diversificar atividades, apropriar-se de ambientes fora da escola pode solucionar um dos maiores problemas enfrentados pelos colégios que planejam oferecer dois turnos aos alunos: a falta de espaço físico.
Apesar de muitas experiências bem-sucedidas no país, a parceria entre escolas e ONGs nem sempre pode ser benéfica.
Risco
Um dos riscos dessa atividade, conforme Lucia Couto, ex-coordenadora de Ensino Fundamental do Ministério da Educação e atual gerente de Desenvolvimento e Conteúdo do Instituto Unibanco, é o desvio de verbas públicas. Ela sugere que o país crie um marco regulatório para a educação integral.

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