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segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Periferia de Belém (PA) dá exemplo para melhorar Ideb

06 de outubro de 2014
Conjunto de ações faz crescer o interesse de alcançar boas notas

Fonte: Amazônia Jornal Online

A prova de que a educação é instrumento de transformação na vida dos jovens é vivenciada por estudantes da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Dr. Celso Malcher, no bairro da Terra Firme, periferia de Belém. Detentora do Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico (Ideb) mais alto da rede estadual para os anos iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 4º ano), com nota 5.5, a escola é hoje referência em qualidade de ensino no Pará. Para as séries finais (5ª a 8ª), a nota também alcançou destaque com os seus 4.8. Com esses indicadores, o colégio já alcançou a meta do Pacto pela Educação estipulada pelo governo estadual e abre caminho para que o sucesso se repita em outras unidades de ensino da rede pública.
Funcionando em um prédio provisório ao fim da avenida Celso Malcher e com cerca de 1.500 alunos, a escola é alvo de inúmeras iniciativas de combate à violência a partir de projetos do Programa Pro Paz e de seu polo na Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra). Esse trabalho também é feito em parceria com a Unidade Seduc na Escola (USE 6), através do envolvimento no Observatório da Violência e das Juventudes, um instrumento de compreensão do imaginário da geração que frequenta essa escola situada em um bairro conhecido pela violência e pela falta de oportunidades. Além destes parceiros, a instituição conta com apoio de ações da Companhia de Policiamento Ostensivo Escolar (Cipoe) e do Programa Educacional de Resistência às Drogas (Proerd).
Depois de tanto empenho de alunos, professores, comunidade e parceiros educacionais dentro e fora da sala de aula, o sucesso no Ideb é um reconhecimento em forma de motivação para o avanço na aprendizagem. É como o diretor da Escola Celso Malcher, Luiz Malato, observa a experiência positiva no ranking nacional de educação. Ele conta que há dez anos o colégio tem se dedicado a testes nacionais para conseguir um aproveitamento positivo gradativamente. “Nessa última versão, tínhamos a expectativa logicamente de ter um aproveitamento melhor em relação à anterior. O que foi surpreendente para nós foi esse aproveitamento muito além da expectativa, por exemplo, nos nossos anos finais”, disse.
Malato lembra que o projeto federal Mais Educação, regulamentado em 2010, cumpriu a função de reforço do aprendizado através da ampliação da jornada escolar e da organização curricular na perspectiva da educação integral. “No caso dos anos iniciais, são feitos simulados com base dos descritores da Prova Brasil. De uma certa maneira, isso facilita aos alunos o contato com a testagem, além de todas as atividades, projetos e a própria aprendizagem em sala de aula. Quando se aproxima a prova, a programação fica focada para a prova. A gente acredita que aí foi o segredo”, atribuiu.
Em relação ao apoio a nível estadual, ele destaca os programas “extremamente louváveis” como o Pro Paz na Escola. No entanto, enfatiza a necessidade de mais apoio a nível federal, sugerindo a criação de núcleos de educação dentro de secretarias para combater a violência na escola e gerar “mais” investimentos na educação. “A gente precisa encarar isso como algo que tem que ser trabalhado pedagogicamente, mas dentro de uma linha de atuação que envolve muito mais do que só ação de instituições ligadas à Justiça ou à própria polícia”, afirmou.
Três escolas saem na frente na pontuação dos anos iniciais
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) ainda não divulgou os detalhes sobre o Ensino Médio, entretanto, as pessoas interessadas podem conferir as escolas estaduais com os melhores resultados no Ideb em Belém. Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, os três primeiros lugares são da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Celso Malcher, com média 5.5; a Escola em Regime de Convênio de Ensino Fundamental Nossa Senhora de Fátima I, com 5.4; e a Escola Estadual de Ensino Fundamental São Vicente, com 5.3.
Quanto à nota dos anos finais do Ensino Fundamental, as três primeiras colocadas são a Escola Estadual de Ensino Fundamental São Vicente, com 4.8; a Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Dr. Celso Malcher, com 4.8; e a Escola Estadual de Ensino Fundamental Inglês de Souza e a Escola Estadual de Ensino Fundamental XV de Outubro, com 4.2, cada.
É baseado nesses exemplos de escolas que o diretor Luiz Malato espera manter os estudantes motivados na busca, em 2015, por um resultado superior ao deste ano. De acordo com ele, a responsabilidade ficou “muito grande”, mas as expectativas são as melhores para “no mínimo” manter a média. “E, na melhor das possibilidades, aumentar mais ainda. Estamos pensando como vamos dar continuidade e assegurar isso. A cobrança da comunidade sobre nós é muito grande, até porque a escola já é uma referência, muito procurada para vagas”, comentou.
Citando a comunidade do entorno da Terra Firme, Malato considera que o reconhecimento nacional pode incentivar também maior participação de pais e responsáveis dos estudantes nas atividades escolares. “Eles (pais de alunos) ficam satisfeitos também a partir do momento que tem uma notícia positiva dessa e passam novamente a confiar na educação. Oscila como somos vistos pela sociedade”, observou acrescentando que o impacto da satisfação ainda toma conta de todos no bairro.
Malato aposta em um futuro em que se discuta educação não somente no aspecto pedagógico mas somado a implantação de políticas públicas de “maior envergadura”, especialmente em instituições de ensino público, a partir da união de alunos, comunidade e gestores educacionais. “É necessário que as instituições públicas, as próprias mantenedoras, a própria instituição no caso o Estado, precisa compreender isso como algo que é emergente e encarar como um desafio no campo das necessidades de fomentar políticas. Isso envolve recursos financeiros, formação de pessoal, entendimento de captação de determinados técnicos dentro do trabalho da escola”, concluiu.
Companheirismo e união são armas para enfrentar dificuldades
A dedicação mútua entre discentes e docentes em prol de uma educação de qualidade é observada pela estudante da 7ª série Maria Gabriela Silva, 13 anos. “Do centro (de Belém) tem escola que não ganhou (entrou no ranking do Ideb) e a gente conseguiu. Estudamos e os professores nos ajudaram a conseguir. Isso chama atenção para cá, porque as pessoas acham que no centro tem mais ensino e educação. A escola aqui é do bairro e a gente conseguiu mais, porque a Celso Malcher é uma escola boa, como muitos falam”, comentou.
A colega de turma Camila Rodrigues, 13 anos, relata que a conquista no Ideb foi “muito importante” por se tratar de uma escola situada em uma área marcada pela criminalidade, “distante” do centro de Belém. “Foi impressionante e surpreendente, porque são os nossos estudos ali. Estou orgulhosa de estudar aqui e espero que, ano que vem, seja uma nota mais alto”, falou animada dentro da sala de aula, após a realização de uma validação trimestral.
A adolescente ressalta o sentimento maior em participar das atividades curriculares, ir às aulas e aprender “mais e mais” com os professores. “Senti orgulho e isso me motiva, sim”, repetiu. Em casa, a aluna contou sobre o desempenho da escola no ranking nacional para a mãe dela, que recebeu a notícia com o mesmo orgulho e esperança de um futuro melhor para a filha. A partir de agora, Camila acredita que é mais “fácil” enfrentar os desafios que surgirem no dia a dia. “As coisas que os professores passam podem ser confusas, então o desafio é aprender para passar de ano e conseguir uma nota boa para a minha escola. Espero uma nota mais alto no Ideb e que a gente tenha mais nível de aprendizagem”, completou, opinando que a educação pode ajudar os jovens que estão “no mundo do crime” a aprender valores e princípios da vida.
Projeto de prevenção à violência colabora com novo momento
A Unidade Seduc na Escola (USE 6) teve participação nesse processo, por meio do projeto de prevenção à violência, o Observatório da Violência e das Juventudes, criado em 2012. A unidade abrange dez escolas dos bairro da Terra Firme, Canudos e Marco, além do Centro de Reabilitação Química localizado ao Marco. Segundo o gestor da USE 6, Jones Barros, a implantação do projeto levou à elaboração do Plano de Segurança Escolar, por cada colégio da rede pública estadual de ensino, cuja meta é reduzir a violência escolar. Na prática, as escolas informam as ocorrências mensais para o Observatório, que a partir das informações age com intervenções.
“De porte da violência de agressão física, verbal, a gente age com palestras, oficinas, ciclos de rodas e diálogos. Temos utilizado a prática da justiça restaurativa, que é a reconciliação, e conversa com pais. Essas ações demandadas pelo observatório vão ao encontro daquilo que as ocorrências demandam”, explicou Barros. Embora não revele em números absolutos, ele calcula uma redução de 80% no número de ocorrências registradas pelas escolas junto ao projeto nos últimos dois anos. “Você tem toda uma política do Pro Paz, do Proerd e das universidades que são parceiros”, pontuou.
Entre as ocorrência “mais comuns”, está a agressão verbal entre alunos, em sua maioria, e entre alunos e professor. “O importante é que essas ocorrências estão reduzindo. As escolas são espaços de conflitos e diferença. Temos escolas com quase três mil alunos. Temos jovens que estão na sua puberdade. O importante é que ao agir na prevenção estamos evitando um número significativo (de novos registros)”, avaliou o gestor, criticando que a escola não pode se transformar em um “campo de batalha” que provoca a evasão escolar e a consequente queda no resultado do Ideb.
De acordo com Barros, a USE já fez o quarto encontro na Ufra (Universidade Federal Rural da Amazônia), cuja temática foi a avaliação da aprendizagem na rede estadual de ensino. Em parceria com a Uepa, ele informa que a unidade buscou oficinas dos descritores de Língua Portuguesa e Matémática, com foco na melhoria no Ideb. “Tivemos um resultado além da meta projetada. O desafio maior é no próximo ano manter esse resultado ou superar. É o momento de ficarmos alegres e também perceber que aumentou a responsabilidade de planejamento, de ação, de intervenção, porque não podemos descuidar. Isso vai demandar esforço de gestão, de ação docente e discente, porque não podemos cair”, finalizou. 

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