21 de Agosto de 2015
No colégio estadual com a pior colocação no Paraná, a distância e as adversidades não impedem os alunos de sonhar com curso superior
Fonte: Folha de Londrina (PR)
Cerca de 20 quilômetros de estrada de terra separam a comunidade rural de Campineiro do Sul do município de Rosário do Ivaí (Norte), onde vivem pouco mais de 5 mil habitantes. O caminho é utilizado por fazendeiros para passagem de gado e também por alunos do colégio rural Campineiro do Sul, que ficou na última colocação entre as escolas estaduais paranaenses classificadas pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) nas provas realizadas em 2014.
Aliás, distância é a palavra que resume a realidade dos moradores e estudantes da comunidade rural. "Escondida" no Vale do Ivaí, Campineiro do Sul fica a aproximadamente 140 quilômetros de Ivaiporã, sede do Núcleo Regional de Educação (NRE). O desempenho no Enem parece um reflexo da distância geográfica. Com a média de 437,32 pontos, o 629º colocado na prova para alunos do 3º ano ficou longe do Colégio da Polícia Militar de Curitiba, que conquistou o primeiro lugar no ranking das escolas estaduais, com a média de 609,09 pontos. A distância entre o colégio e as unidades dos grandes centros também é visível quando se olha para as paredes da escola. A direção do Campineiro do Sul recebe cerca de R$ 770 mensais do governo estadual para manutenção do colégio e já protocolou dois pedidos para pintura do local, o que não foi atendido pela Secretaria Estadual de Educação (Seed).
O distanciamento com a área urbana continua além dos muros da escola quando se trata dos aspectos socioeconômicos. A maioria dos 700 habitantes trabalha na zona rural de Rosário do Ivaí, na pecuária ou na agricultura. Além disso, o colégio Campineiro do Sul é a única escola estadual que aparece com nível socioeconômico "baixo" entre todas as classificadas pelo Enem no Paraná.
No entanto, a distância diminui quando se enxerga a realidade por trás das estatísticas. Em comum com os estudantes dos colégios das grandes cidades, os alunos da zona rural sonham com o curso superior e com um emprego na área da formação profissional. Pedreiro de dia e universitário de noite, Lucas Fulam, ex-aluno do Campineiro do Sul, conseguiu uma bolsa de estudo pelo Programa Universidade Para Todos (Prouni) por meio da nota obtida no Enem em 2011. "Estou no último semestre de Ciências Contábeis e quero começar a trabalhar na minha área a partir do próximo ano. Quero me mudar para Arapongas para procurar emprego nas indústrias da cidade", projeta o aluno que faz o curso à distância em polo instalado em Rosário do Ivaí. No início do curso, ele lembra que ainda utilizava a estrutura do colégio Campineiro do Sul para fazer atividades e acompanhar as aulas no laboratório de informática. "Agora, tenho um computador em casa com internet", conta Fulam.
PARTICIPAÇÃO
Apesar da última colocação, o diretor do colégio, Valdino de Souza Freire Júnior, comemorou o resultado da escola que atende 77 alunos, sendo 36 do Ensino Médio. No ano passado, 14 estudantes realizaram o Enem entre os 21 matriculados no 3º ano, o que representa 66,67% de adesão. "O Paraná tem cerca de 2.100 escolas estaduais, sendo que mais da metade não se classificou no Enem. Além disso, ficamos entre os seis colégios classificados no NRE de Ivaiporã. Consideramos ainda mais importante o incentivo da escola para que os alunos façam um curso superior", comenta. Ele ainda lembra que os alunos enfrentam dificuldades na locomoção de ônibus para realização das provas do Enem em Ivaiporã. "São dois dias de exame e os estudantes vão às 5h30 para a cidade e só voltam às 20h. Alguns desistem no segundo dia", acrescenta.
Apesar da última colocação, o diretor do colégio, Valdino de Souza Freire Júnior, comemorou o resultado da escola que atende 77 alunos, sendo 36 do Ensino Médio. No ano passado, 14 estudantes realizaram o Enem entre os 21 matriculados no 3º ano, o que representa 66,67% de adesão. "O Paraná tem cerca de 2.100 escolas estaduais, sendo que mais da metade não se classificou no Enem. Além disso, ficamos entre os seis colégios classificados no NRE de Ivaiporã. Consideramos ainda mais importante o incentivo da escola para que os alunos façam um curso superior", comenta. Ele ainda lembra que os alunos enfrentam dificuldades na locomoção de ônibus para realização das provas do Enem em Ivaiporã. "São dois dias de exame e os estudantes vão às 5h30 para a cidade e só voltam às 20h. Alguns desistem no segundo dia", acrescenta.
Na opinião do diretor, os alunos devem permanecer na comunidade rural após a conclusão do Ensino Médio para fazer universidade na região com o apoio familiar. "Quando o jovem sai muito cedo para a cidade grande corre o risco de enfrentar problemas sociais e até se envolver com drogas por falta de estrutura, principalmente dos pais. Por isso, incentivamos a entrada no curso superior e deixamos a escola disponível para o ex-aluno."
Formado no colégio Campineiro do Sul, o universitário do curso de história Fernando Pereira de Souza, 20 anos, trabalha em uma propriedade rural e auxilia o pai na produção de vacas leiteiras. "Quero ser professor para trabalhar em Curitiba, onde tenho alguns parentes", diz. O jovem não conseguiu a bolsa de estudo, mas conta com o apoio da família para pagamento dos estudos, também realizados na unidade à distância em Rosário do Ivaí. "Todos dos dias, o estudo me faz falta e quero que meu filho aprenda uma profissão que ele goste e dê valor", afirma o pecuarista Adilson Soares. O NRE de Ivaiporã foi procurado para comentar o resultado do colégio Campineiro do Sul no Enem, mas preferiu não se manifestar e afirmou que apenas a Seed poderia prestar esclarecimentos.
Entre as cinco melhores, escola rural investe em projetos
O Colégio Estadual do Campo Bom Jesus, localizado na zona rural de Marmeleiro (Sudoeste), atingiu a média de 550,44 pontos no Enem do ano passado nas provas objetivas e ficou na quarta colocação entre as escolas estaduais paranaenses com o melhor desempenho na prova. O colégio é o único com nível socioeconômico "médio baixo" entre os 100 primeiros do ranking do Enem no Paraná. O diretor da escola, Mauro Fischer, revela que ficou surpreso com o resultado. "Houve uma preparação voltada para o Enem, mas não esperávamos que o colégio ficasse entre os cinco melhores do Estado", afirma. Em 2013, a média do Bom Jesus no exame foi de 464,96 pontos.
A escola, atualmente com 215 alunos, teve 10 alunos participantes no Enem 2014, o que representa 55% dos estudantes matriculados no último ano do Ensino Médio. Fischer afirma que parcerias com a comunidade e projetos com envolvimento de alunos foram fundamentais para o resultado. Ele lembra que os estudantes participam de cursos de formação na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e outros órgãos com objetivo de formar o aluno no ensino superior para trabalhar no campo a fim de que o morador possa continuar na área rural.
A nota média na redação do Enem também subiu de 410 para 550 pontos. "Hoje, temos um projeto de leitura na escola, o que influenciou no resultado da redação. Uma vez por semana, todas as atividades do colégio são paralisadas por cerca de 30 minutos para que os alunos possam pegar um livro e fazer uma leitura. Isso ajuda o estudante a escrever melhor e a interpretar os textos das provas", explica.
Além disso, a escola promove a feira "Valores da Nossa Terra" com a produção das comunidades rurais da região, entre elas, pães caseiros, frutas, milho e legumes. "A Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná) realiza a rotulação dos produtos, o que profissionaliza o trabalho dos pequenos agricultores. Restos de frutas e óleo ainda são usados na produção de produtos de limpeza e sabão. Para quem é da comunidade, a parte econômica faz muita diferença", ressalta. Localizada na marginal da PR-180, a 15 quilômetros da divisa com Santa Catarina, a escola ainda desenvolve um projeto de preservação ambiental e recolhe detritos deixados na marginal da rodovia. "Vamos instalar placas para lembrar os motoristas da importância da preservação da área", adianta.
DIFICULDADES
Mesmo assim, a escola enfrenta dificuldades e conta com apoio da comunidade para reformas na estrutura do colégio. Com o repasse mensal de aproximadamente R$ 800, a unidade não possui telefone fixo e utiliza o celular do diretor para os contatos de trabalho. Após 15 arrombamentos, a direção do colégio também instalou um sistema de monitoramento, custeado pela prefeitura.
Mesmo assim, a escola enfrenta dificuldades e conta com apoio da comunidade para reformas na estrutura do colégio. Com o repasse mensal de aproximadamente R$ 800, a unidade não possui telefone fixo e utiliza o celular do diretor para os contatos de trabalho. Após 15 arrombamentos, a direção do colégio também instalou um sistema de monitoramento, custeado pela prefeitura.
Moradora da comunidade Bom Jesus, Joeli Pontes da Silva, 16 anos, vai realizar o Enem pela primeira vez neste ano. "Com minha nota, espero entrar na Unioeste no curso de pedagogia para, futuramente, ser professora em Marmeleiro", disse a aluna do 3º ano.
Programa Meta
O Governo do Estado realiza na próxima segunda-feira (24) uma reunião com os chefes dos Núcleos Regionais de Educação para lançamento do Programa Meta com o intuito de melhorar os índices das escolas paranaenses nas avaliações do Ministério da Educação. Segundo a superintendente de Educação, Fabiana Campos, seis ações serão apresentadas e as escolas poderão priorizar uma das áreas, entre elas, a educação integral e a formação continuada dos docentes. Ela acredita que pequenas intervenções que não demandam investimentos e pessoal. "Um projeto de leitura pode ter bons resultados. Além disso, o envolvimento da família é fundamental importância para a escola e na formação do aluno como cidadão", avaliou. (R.F)
O Governo do Estado realiza na próxima segunda-feira (24) uma reunião com os chefes dos Núcleos Regionais de Educação para lançamento do Programa Meta com o intuito de melhorar os índices das escolas paranaenses nas avaliações do Ministério da Educação. Segundo a superintendente de Educação, Fabiana Campos, seis ações serão apresentadas e as escolas poderão priorizar uma das áreas, entre elas, a educação integral e a formação continuada dos docentes. Ela acredita que pequenas intervenções que não demandam investimentos e pessoal. "Um projeto de leitura pode ter bons resultados. Além disso, o envolvimento da família é fundamental importância para a escola e na formação do aluno como cidadão", avaliou. (R.F)
Ranqueamento é injusto, diz educador
Para o gerente de Conteúdo do movimento Todos pela Educação, Ricardo Fatzetta, o Enem não pode ser considerado um "termômetro" do Ensino Médio, já que se tornou um exame para certificação da conclusão dos estudos e, principalmente, uma porta de entrada para as universidades. Assim, o exame teria um caráter mais individual do que uma avaliação do colégio, como ocorre na Prova Brasil.
Ele lembrou que os diferentes níveis socioeconômicos, a permanência dos alunos na escola, o número de estudantes na unidade, a formação dos professores e a série histórica são disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (Inep) e precisam ser levados em consideração durante as comparações entre os colégios. "O ranqueamento é injusto e é muito cruel rotular uma escola em função de apenas um resultado", afirmou. De acordo com Fatzetta, o resultado pode sofrer distorções que precisam ser analisados de maneira isolada. "As escolas particulares utilizam o Enem, principalmente, para a divulgação comercial", acrescentou. (R.F.)
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