Marjorie Ribeiro - Portal Aprendiz - 21/02/2013 - São Paulo, SP
No final de 2012,
alunos da Escola Municipal Osvaldo Cruz, em Salvador (BA), tiveram uma
experiência diferente ao realizar a Olimpíada do Meio
Ambiente: saíram da sala de aula e foram até a praia para
estudar e praticar a coleta de lixo. “O resultado disso foi um
vídeo e um jornalzinho para alertar os moradores sobre a
poluição”, relata a vice-diretora da
instituição de ensino, Danielle Silva. Para ela, aprender
Ciências com os pescadores, História com o mestre de capoeira,
e Literatura na Biblioteca tem contribuído na formação
cidadã dos estudantes.
Outras seis
escolas públicas – que abrangem os ensinos Infantil,
Fundamental e Médio – do bairro Rio Vermelho, na orla da
capital baiana, também passaram a olhar a educação de
forma mais ampla, aliando o saber acadêmico com o popular, a
comunidade com a escola, os professores tradicionais com os educadores
populares.
Esse é o
embrião do Bairro-Escola que está sendo implementado na
região.
Idealizada e
coordenada pelo Instituto Inspirare, em parceria com a ONG Cipó e
com a Associação Cidade Escola Aprendiz,
organização sediada em São Paulo e que já
disseminou o bairro-escola em outras cinco cidades brasileiras, a
iniciativa recebe apoio ainda da Secretaria Estadual de
Educação da Bahia e uma articulação com a nova
gestão municipal já está sendo feita.
Construção Coletiva
Um dos alicerces
do projeto são as Trilhas Educativas, metodologia que incorpora os
saberes locais no currículo escolar. “Na escola não se
valoriza os conhecimentos culturais e artísticos que a
criança traz. As Trilhas Educativas permitem isso no contexto da
escola, a reflexão sobre Matemática e Inglês, por
exemplo, vai vir a partir da visão de mundo das
crianças”, explica a diretora pedagógica da
Associação Cidade Escola Aprendiz, que desenvolve a
tecnologia, Helena Singer.
Para o professor
de História do Ensino Fundamental e vice-diretor da
Educação de Jovens e Adultos da Escola Estadual Alfredo
Magalhães, Marcelo Lima, a proposta torna a escola mais atraente e
contribui para a permanência do aluno. “Muitos jovens adoram a
escola, mas não suportam as aulas. Eles resistem ao conhecimento
porque ele está sendo imposto, mas quando é construído
coletivamente é diferente”, defende.
Além disso,
a pesquisa passa a ser feita no entorno da instituição de
ensino – como indica o nome “trilha” -, aproximando o
estudante das oportunidades culturais e educativas do bairro. Helena
salienta que toda essa movimentação acaba tendo um impacto na
própria estrutura e organização escolar, estimulando
os educadores a trabalharem em equipe, pensarem o papel da escola na
comunidade e a discutirem um projeto político
pedagógico.
Novo
paradigma
O projeto
começou a ser discutido em setembro de 2012 em um grande
seminário, com a participação de mais de 60 pessoas,
entre educadores, diretores de escolas, líderes comunitários,
grupos culturais e outros atores sociais, que se dividiram em Grupos de
Trabalhos. De acordo com a diretora do Instituto Inspirare, Anna Penido, o
debate teve como norte os três eixos da metodologia do bairro-escola:
arranjos culturais, comunicação e educação
integral.
A primeira
estratégia, segundo a coordenadora da ONG Cipó, Scheilla
Gumes, é a “ocupação de espaços
públicos para ressignificá-los, mapeando possibilidades de
aprendizagem”. Para colocá-la em prática, o movimento
adotou uma praça abandonada e depredada, usada durante a noite como
estacionamento, com carros que paravam em cima do gramado e dos brinquedos.
Um grande evento cultural marcou o início das atividades no local,
que foi rebatizado de Praça do Pôr-do-Sol.
No dia 15 de
dezembro de 2012, apresentações de dança, pinturas,
ioga para crianças, contação de histórias,
entre outras atividades, tomaram a “nova” praça. Desde
então, um grupo de jovens vem atuando na sua
recuperação física e ocupação com uma
programação cultural permanente.
Para informar e
mobilizar a população em torno do tema, a ideia é
criar agências de notícias nas escolas que alimentem
agências comunitárias e, paralelamente, realizar uma grande
campanha de conscientização. “O que é um bar de
um bairro educador? É o bar que não joga o lixo na
calçada porque a criança vai passar pra fazer suas trilhas
educativas, que não vende bebida para menor de 18 anos e que
participa das atividades no seu entorno”, reflete.
Com o objetivo de
incorporar esse novo paradigma no cotidiano escolar, desenvolvendo
atividades que permitam uma articulação maior com a
comunidade, será realizado, a partir de abril, um programa de
formação com os professores.
Por que o Rio
Vermelho?
“Além
de ter uma importância histórica, ele é um bairro
criativo, de resistência, que traduz um pouco da cultura de Salvador
e tem ressonância na cidade”, justifica Anna. Com uma vida
noturna agitada e uma população predominantemente de classe
média, a maioria dos aluno das escolas públicas locais
não mora necessariamente no Rio Vermelho, mas nas redondezas, em
regiões como Vale das Pedrinhas, Santa Cruz, Federação
e Vasco da Gama.
Como fazer,
portanto, com que esses jovens se sintam pertencentes ao Rio Vermelho,
estimulando-os a aproveitar as suas potencialidades culturais e
educativas?
Para Helena, o
caminho é promover o diálogo entre os moradores da classe
média e os das proximidades. “Quando falamos em Rio Vermelho
pensamos em classe média porque ninguém enxerga as
comunidades dos entornos e elas não se enxergam como parte do
contexto boêmio e artístico. Precisamos criar as pontes para
que eles se percebam como moradores, frequentadores e estudantes do mesmo
território, a partir da produção cultural
também das comunidades”, aponta.
Anna Penido avalia
que o Rio Vermelho é apenas o primeiro passo. “Queremos chegar
nas regiões próximas e queremos que os alunos levem isso pra
lá, mas vamos começar pelo bairro onde estão as
escolas, que é um espaço importante para a
formação deles.” E complementa: “Achamos que
começando ali, isso vai reverberar mais fortemente. A nossa
intenção é inspirar a cidade de Salvador e o estado da
Bahia com essa experiência”.
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