10/12/2010
Colégio Pedro II é conhecido por ensino acima da média do oferecido na
rede pública
O clima é tenso e o
silêncio predominante. Centenas de pessoas lotam o auditório com o olhar fixo
para o palco, onde uma mulher gira uma urna repleta de papéis. A cena poderia
retratar perfeitamente um sorteio da Mega-Sena. Não retrata, mas algumas vidas
ali presentes também poderão mudar. O cenário em questão refere-se ao sorteio
de vagas para o primeiro ano do Ensino Fundamental do tradicional Colégio Pedro
II, no Rio de Janeiro.
Com 173 anos de
existência, completados no início deste mês, a instituição de ensino mantida
pelo Governo Federal recebe, a cada final de ano, centenas de pais ávidos para
conseguir uma vaga para os filhos no colégio reconhecido pelo ensino de
qualidade acima da média do oferecido na rede pública. Na lista de ex-alunos
estão alguns personagens ilustres, entre eles, a atriz Fernanda Montenegro, o
poeta Manuel Bandeira e o ex-presidente marechal Floriano Peixoto.
“O sucesso da nossa fórmula está no corpo docente. Cerca de 40% dos
nossos professores possuem mestrado e, 10%, doutorado”, informa a
diretora-geral Vera Rodrigues. No ranking do Enem 2009, a unidade Centro do
Colégio Pedro II ficou no 102º lugar, entre as 25.484 escolas existentes
no Brasil. No Rio, a instituição ficou na 29ª posição e, entre os colégios
públicos fluminenses, na 3ª colocação.
Atualmente, o Pedro
II possui oito unidades espalhadas pela Região Metropolitana do Rio, mas apenas
cinco recebem alunos do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental. A partir do 6º ano,
todas as unidades recebem estudantes, mas o ingresso, assim como no Ensino
Médio, acontece por provas. O ingresso por sorteio ocorre apenas no primeiro
ciclo do Ensino Fundamental.
Neste ano, foram
registradas mais de seis mil inscrições para as 438 vagas existentes. Na
unidade de São Cristóvão, na zona norte do Rio, que abriga a direção-geral,
foram oferecidas 150 vagas e contabilizadas 2.050 inscrições.
Lágrimas
de felicidade
“Isso aqui parece
jogo entre Vasco e Flamengo”, compara um pai, tamanho é o clima tenso no
auditório do colégio em São Cristóvão minutos antes do início do sorteio,
ocorrido nesta sexta-feira (10). O primeiro nome é tirado da urna e lido em voz
alta. Silêncio no local. O responsável pela criança não estava presente. A
situação foi a mesma com o segundo nome. O gelo só foi quebrado no terceiro .
“Aqui! Aqui!”,
comemora Tatiana Braga, aos gritos e com os braços para o ar, ao escutar o nome
da filha caçula. “Agora estou aliviada. Pagar colégio está muito caro”, diz a
professora, moradora da Tijuca, que já tem a filha mais velha estudando na
instituição de ensino centenária.
O procedimento
continua. Alguns sorteados são mais contidos, sequer levantam da cadeira ao
ouvir o nome do filho. Quem ainda não teve a mesma sorte reza, outros roem
unhas. “Mãe, tomara que eu seja sorteada. Torce por mim”, pede uma menina à
mãe, mostrando maturidade de gente grande.
Ao ouvir o nome do
neto, a aposentada Júlia Moreno começa a chorar, se ajoelha e levanta as mãos
para o alto, segurando um terço. “Antes do nome ser lido, eu já estava dizendo
‘obrigada Senhor por já estar aqui’. Temos que agradecer porque muitas pessoas
não puderam sequer pagar o valor da inscrição”.
Mãe de três filhos,
sendo um ex-aluno que hoje trabalha na Petrobras, a moradora de São Cristóvão
revela que já vinha cumprindo uma maratona espiritual há semanas para o
sorteio. “Fui à igreja e coloquei o nome do meu neto embaixo do Santíssimo e
rezava diariamente o terço da misericórdia. Ao entrar no colégio, eu disse:
‘Senhor, entre primeiro na minha frente’”, conta.
Desempregada e
estudando para concursos, Laires Lima também apelou para a fé. E deu certo.
“Acendi uma vela antes de sair de casa. É muito bom saber que meu filho tem um
futuro garantido. O ensino é muito bom e aqueles que se dedicam praticamente
saem daqui direto para uma faculdade pública”, diz.
Viúva, a moradora
de Duque de Caxias foi às lágrimas ao ouvir a boa nova e ligou para a mãe para
compartilhar. “Ela disse para meu filho que Deus estava nos olhando lá de cima
e ele disse: meu pai também’”, relata, emocionada.
Melhores
do mundo
As vagas vão
acabando e algumas pessoas vão se desesperando. “Mexe mais essa urna!”, grita
uma mãe. A técnica parece ter ajudado a analista de sistemas Mariana Bernardo,
que levantou da cadeira e começou a pular de felicidade ao ter o filho
contemplado com uma cobiçada vaga.
“O meu sonho era
colocá-lo para estudar aqui e agora vou realizá-lo. É muito bom saber que meu
filho vai estudar em uma escola pública com bons professores, o que vai
proporcioná-lo uma ótima formação. Estou segura em relação ao futuro dele”, diz
a moradora do Méier.
Um exame recente feito pelo Programa de Avaliação Internacional de
Estudantes (Pisa) mostrou que os alunos da rede
federal de educação básica estão entre os melhores do mundo. A média geral –
528 – está à frente de países como França, Estados Unidos, Israel, Espanha,
Reino Unido, Dinamarca, Alemanha, Austrália e Canadá.
O sorteio das 150
vagas acaba e mais 15 nomes são tirados da urna para compor uma lista de
espera. Muitos deixam o auditório, mas a maioria ainda mantém a esperança. “Vai
que algum maluco desiste. Sempre tem”, murmura um pai.
O procedimento tem fim e alguns não
tiveram o sonho realizado por pouco. “Sortearam a inscrição 1512 e a minha era
1513”, lamenta o motorista Bruno Araújo. Mesmo chateada, a assistente
administrativa Adriana Ferreira mostra confiança. “Não podemos desistir, ainda
há a possibilidade da prova. Uma hora a gente chega lá”, diz.
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