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sábado, 23 de março de 2013

Governo reage a projeto que prevê fichamento de aluno usuário de drogas

23/03/2013
Ministério da Saúde e Presidência temem "criminalização" de estudantes nas escolasVinicius Sassine
BRASÍLIA O projeto de lei que cria um cadastro de usuários de drogas no país, prestes a ser votado pelo plenário da Câmara, prevê que as escolas fichem alunos usuários ou sob suspeita de uso de alguma substância ilícita. A polêmica proposta despertou reações contrárias do governo, manifestadas em duas notas técnicas do Ministério da Saúde e da Secretaria Geral da Presidência da República, obtidas pelo GLOBO.
Nos documentos, elaborados em outubro do ano passado, técnicos e diretores das duas pastas apontam a "criminalização" e a "marginalização" dos estudantes, caso o projeto se torne lei. O governo está preocupado com a grande possibilidade de aprovação da proposta em plenário, principalmente em razão da força da bancada religiosa na Câmara, interessada no fortalecimento das comunidades terapêuticas dirigidas por padres e pastores.
Conforme o artigo 16 do projeto de lei nº 7.663/2010, caberá a instituições de ensino preencher uma "ficha de notificação, suspeita ou confirmação de uso e dependência de drogas". O objetivo desse fichamento, segundo o texto final do projeto que será levado a plenário, é o "registro, estudo de caso e adoção de medidas legais". A proposta prevê ainda que caberá aos professores identificar nos alunos sinais de uso de drogas ilícitas e de álcool, para um posterior encaminhamento à rede de saúde.
O relator do projeto de lei, deputado federal Givaldo Carimbão (PSB-AL), defende outro ponto considerado polêmico e reprovado nas notas técnicas do Ministério da Saúde e da Secretaria Geral da Presidência. A proposta é ampliar em 10% a quantidade de vagas em instituições federais de ensino, a serem destinadas a dependentes químicos em tratamento médico e em abstinência. Se voltarem a usar drogas, esses pacientes perderiam a vaga conquistada nas instituições de ensino.
Carimbão tem como base eleitoral comunidades católicas em Alagoas. Ele é responsável por comunidades terapêuticas que cuidam de dependentes de drogas. O autor do projeto é o deputado Osmar Terra (PMDB-RS), médico e ex-secretário de Saúde no Rio Grande do Sul.
- Se de repente tem algum aluno, o professor tem de trabalhar para encaminhar o pessoal ao serviço de saúde. Na sala de aula pode ter alguma pessoa que está usando drogas. O professor é um orientador da família, que é chamada se tem alguma coisa estranha. A ideia é abrir espaço para que a família não seja a última a saber - defende Carimbão.
Osmar Terra, por sua vez, afirma que o artigo que prevê o fichamento de alunos nas escolas não fazia parte do projeto original. A inclusão foi feita pelo relator na comissão especial e precisa ser melhor discutida, segundo o deputado. Quanto ao cadastro geral de usuários, a proposta estipula que todas as internações e altas hospitalares deverão ser registradas - em caráter sigiloso - no Sistema Nacional de Informações Sobre Drogas, em até 72 horas.
O projeto também prevê a internação compulsória de dependentes químicos, a ser solicitada por familiar ou servidor público que tenha tido contato com o usuário de drogas. A proposta não deixa claro se uma internação involuntária poderá ser solicitada por um professor ou diretor de escola.
"A instituição escola (...) se fragiliza na medida em que se torna um "espaço inquisidor", podendo inclusive adotar posições criminalizadoras", diz a nota técnica do Departamento de Ações Programáticas Estratégicas do Ministério da Saúde. Posição semelhante foi adotada pelo Departamento de Assuntos Legislativos da Secretaria Geral da Presidência: "Ainda que se compreenda o ambiente escolar como o "locus" privilegiado para políticas públicas voltadas à prevenção das drogas, é necessário termos cautela para não reproduzirmos estereótipos e fomentar a marginalização do jovem."
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) critica a possibilidade de alunos serem fichados nas escolas.
- Trata-se de um processo de estigmatização social dos jovens usuários de drogas - afirma o presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos da OAB, Wadih Damous.
Na última terça-feira, 12, o plenário da Câmara aprovou regime de urgência para a votação do projeto. A análise está prevista para depois da Semana Santa

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